Por Cleber Lourenço
A oposição anunciou nesta terça-feira (8) a suspensão da obstrução total das comissões e do plenário. O gesto foi formalizado em nota oficial assinada pelo deputado Luciano Zucco (PL-RS), líder da bancada, que afirma ser “um gesto político às lideranças partidárias da Casa, com o objetivo de viabilizar o apoio necessário para a aprovação do regime de urgência do Projeto de Lei da Anistia”.
O texto também classifica o tema como “urgente e essencial para garantir segurança jurídica, respeito às liberdades individuais, à Constituição Federal e à democracia”. Segundo a liderança, a oposição seguirá “firme na defesa dos direitos dos cidadãos, do devido processo legal e do Estado Democrático de Direito”.

Luciano Zucco (PL-RS)
Nos bastidores, a decisão é vista como tentativa de conter o desgaste crescente com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Nas últimas semanas, o deputado vinha sendo pressionado por apoiadores de Jair Bolsonaro a pautar a urgência da anistia. Motta manteve postura discreta, não se comprometeu com o avanço da proposta e tampouco se afastou da articulação. Ainda assim, passou a ser alvo de ataques em grupos bolsonaristas, o que acendeu alertas sobre um possível isolamento da pauta.
A leitura entre parlamentares é que a suspensão da obstrução também buscou sinalizar recuo antes que o impasse com Motta se transformasse em crise política. O gesto, no entanto, chegou tarde: a obstrução não surtiu nenhum efeito prático, e durante sua vigência o governo não teve dificuldades para aprovar matérias nem sofreu obstruções relevantes. “Foi apenas simbólica”, resumiu um aliado do governo.
Proposta da anistia
Parlamentares do PL reconhecem que a proposta de anistia não tem força para avançar e que seu valor político, neste momento, está mais relacionado à mobilização digital da base bolsonarista. Um influente deputado da oposição teria afirmado a colegas que o tema “é mais para gerar like e engajamento do que por convicção de que vai passar”.
A percepção é compartilhada por aliados do próprio Hugo Motta. Para esse grupo, a proposta da anistia serve hoje mais como bandeira de agitação do que como projeto legislativo viável. Integrantes da oposição admitem que, ao insistir nesse caminho, o campo bolsonarista pode estar enfraquecendo sua atuação no Congresso.
Há também a constatação de que o desgaste com a presidência da Câmara pode comprometer não só a anistia, mas outras propostas futuras. Como é Hugo Motta quem define a pauta da Casa, o receio é de que a insistência em confrontos públicos acabe dificultando ainda mais o espaço da oposição no processo legislativo.
A frustração com os rumos da pauta se soma à percepção de que o debate público vinha sendo mais favorável à oposição quando temas econômicos, como o preço dos alimentos e as falhas no Pix, dominavam o discurso. Parlamentares experientes do PL avaliam que a guinada para uma agenda mais ideológica, sem viabilidade concreta, desorganizou a estratégia e esvaziou o impacto político.
A bandeira da anistia e o legislativo
Outras iniciativas que vinham sendo planejadas, como o ato com familiares de presos pelos ataques de 8 de Janeiro, também devem perder fôlego. A sensação é de que a agenda foi esvaziada por completo e, mesmo entre seus defensores, já não há convicção sobre sua continuidade.
A expectativa interna é que o gesto de “boa vontade” ao suspender a obstrução ao menos viabilize a votação do regime de urgência. Mas mesmo esse objetivo parece improvável: parlamentares admitem que, se a urgência for pautada, a tendência é que seja rejeitada. A manobra, nesse caso, pode servir como saída para encerrar a discussão sem que a base bolsonarista tenha que reconhecer abertamente uma derrota.
A anistia segue como bandeira retórica, mas distante de se tornar realidade legislativa.
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