Na madrugada de 8 de novembro de 1997, em Santos (SP), oito jovens com idades entre 14 e 20 anos perderam a vida após assistirem ao show dos Raimundos no Clube de Regatas Santista. Essa foi a minha primeira experiência, como jornalista, diante de uma tragédia cuja dor só compreendi 20 anos depois, ao me tornar mãe. O local comportava 2.600 pessoas, mas naquela noite estavam presentes quase 6.000.
Ao final do show, o público começou a sair pela escadaria “um”, a única liberada pelos seguranças. O efeito manada empurrou as pessoas contra os corrimãos, que cederam. Jovens despencaram de uma altura de cinco metros uns sobre os outros. Relatos de testemunhas indicam que a pilha de pessoas chegou a quase dois metros. Oito inocentes morreram asfixiados, com lesões múltiplas, e mais de 60 ficaram feridos. O que deveria ter sido uma noite de diversão destruiu oito famílias santistas.
Naquele ano, eu estava me formando e já trabalhava como repórter iniciante da TV Tribuna, afiliada à Rede Globo, na Baixada Santista. Coube a mim entrevistar as famílias das vítimas, testemunhando o horror e a dor estampados nos olhos humanos incrédulos. Santos é uma cidade relativamente pequena; um dos pais que perdeu a filha de 16 anos, eu costumava encontrar no mar, surfando. Nunca mais o vi desde aquela madrugada.
A cidade de Santos precisou testemunhar a morte violenta de oito jovens para que a legislação se tornasse mais rígida. O Clube de Regatas era um dos mais tradicionais da região, e as pessoas confiavam nele, assim como confiamos nos estabelecimentos quando deixamos nossos filhos saírem para eventos. Os pais de Ana Clara Benevides Machado, de 23 anos, confiaram que a filha voltaria para casa, no Mato Grosso, depois de realizar o sonho de assistir ao show da cantora Taylor Swift, no Rio de Janeiro.
A morte de Ana Clara ocorreu no mesmo mês em que a tragédia no clube santista completou 26 anos. Ana Clara morreu, muito provavelmente – o relatório de necropsia final só sairá em 30 dias -, em decorrência do calor e das altas temperaturas daquele dia. Há relatos de jovens que tiveram queimaduras de segundo grau nas estruturas metálicas próximas ao palco. A temperatura recorde no Rio de Janeiro foi de 42,5 graus, com sensação térmica de 50 graus.
Tanto em Santos quanto no Rio, famílias foram privadas da convivência com seus filhos e filhas. Histórias e sonhos morreram com esses jovens. O inaceitável, nos dois casos, é a certeza de que essas vidas terminaram por negligência. Não há reparação para a perda de um filho; é uma dor tão dilacerante que não tem nome. A segurança não pode ser apenas uma linha no orçamento de empresas milionárias produtoras desse tipo de evento. A vida precisa ter um valor maior do que isso, e não podemos perder a capacidade de nos indignar.
Meu sincero abraço para aqueles que perderam seus entes queridos. Eu sinto muito
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