Uma análise feita pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostrou que, apesar do Brasil ter tido uma melhora econômica significativa em 2023, o mercado de trabalho continua sendo um setor reprodutor de desigualdade racial. Segundo o Dieese, essa dificuldade é percebida desde a inserção em um emprego, na busca de ascensão na carreira, até na remuneração das pessoas pretas.
O estudo, apresentado em Boletim Especial pelo Dia da Consciência Negra, foi baseado em dados coletados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), referente ao 2º trimestre de 2023, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De acordo com o Dieese, embora a população preta com idade de trabalhar seja majoritária, (56,1%), apenas 33,7% ocupa cargos de direção e gerência no mercado de trabalho. Isso significa que um a cada 48 trabalhadores negros conseguem alcançar essa função. Para pessoas não negras, a proporção é de um para 18 trabalhadores.
O Boletim aponta que as dificuldades das pessoas pretas já se iniciam na entrada no mercado de trabalho. A taxa de desocupação dessa população é de 65,1%. Isso quer dizer que mais da metade das pessoas sem ocupação no país são negras.
Porém, mesmo quando estas pessoas conseguem um emprego, as condições de inserção se mostram mais desfavoráveis do que para pessoas não pretas. A informalidade é maior para essa parte da população: 46% estava nesta categoria de trabalho,comparado a 34% da população não negra.
“O acesso à educação é a principal causa para essa disparidade. Sem condições financeiras, o estudo é negado e a população preta fica relegada ao subemprego”, considera o secretário de Combate ao Racismo da CNTE, Carlos Furtado.
Segundo ele, essa desigualdade racial nas relações de trabalho é um processo contínuo de colonialidade, uma vez que discriminação racial ainda persiste entre os trabalhadores/as.
SALÁRIO DESIGUAL
A remuneração também foi um aspecto com grande desigualdade. Os dados mostram que trabalhadores negros ganhavam até 39,2% a menos que trabalhadores não negros, em todas as posições de ofício.
Conforme cita os dados do IBGE, a média salarial de pessoas pretas é de R$2.192, comparada a R$3.605 de pessoas não pretas.
Para o estudo, essa diferença de valor salarial evidencia que, além da desigualdade de oportunidade, pessoas pretas também são tratadas de forma diferente no mercado de trabalho.
Gênero e cor
Outro aspecto da análise chama atenção para as dificuldades dobradas que mulheres pretas sofrem. Além de questões raciais, as discriminações atreladas ao gênero dificultam ainda mais a presença e o crescimento profissional das mulheres nos empregos.
Segundo os dados, a taxa de desocupação de mulheres pretas é de 11,7%. Esse foi o mesmo percentual vivido por pessoas não negras durante o pior momento da pandemia.
Mais de um quarto das mulheres pretas (26,6%) aptas a trabalhar declararam estar 1- desocupadas; 2- sem procurar trabalho por falta de perspectiva; e 3- estavam ocupadas, mas com carga de trabalho inferior ao que gostariam. Entre os homens não negros, a taxa foi de 11,2%.
Esse público feminino também liderou o índice de trabalhadores em condições mais precarizadas em termos de direitos trabalhistas e reconhecimento: 46,5% das mulheres negras estavam em ofícios desprotegidos. Uma em cada seis (16%) trabalhava como empregadas domésticas, e as que possuíam carteira assinada exercendo a função recebiam em média R$904 de salário – cerca de R$416 reais a menos que o salário mínimo estabelecido.
“Ainda há um longo caminho pela frente, no âmbito de garantir a equidade escolar e no campo do trabalho (entre pessoas pretas e brancas)”, menciona Carlos. Entretanto, ele cita que ações como a nova política de cotas sancionada pelo Governo Federal, com o mote “Cotas Abrem Portas”, já são bons pontos de partida para que esse objetivo seja alcançado.
Como exemplo, ele destaca a iniciativa lançada pelo Presidente Lula na última segunda-feira (20), dia que também celebra a Consciência Negra no país.
No Pacote da Igualdade Racial, o Governo Federal prevê investimentos voltados para a capacitação de pessoas pretas em cursos para o uso de tecnologia social sustentável de baixo custo, em formação empreendedora para a comercialização do excedente de produção e em ações de transferência de tecnologia. “Isso será bom para incluir o povo preto no mercado de trabalho”, enfatiza.
“Na perspectiva da equidade, é muito bom ter um governo sensível a causas relacionadas a gênero, aos quilombolas, indígenas e raciais”, ele afirma.
Segundo ele, a expectativa é que ocorra cada vez mais um aquilombamento no governo, escolas, universidade e no mundo do trabalho. “Junto com o governo, com movimentos sociais e todas/as de boa vontade, vamos avançar rumo à equidade racial que tanto almejamos e lutamos, diminuindo essa superioridade da branquitude no mundo trabalho. Temos muito a fazer e estamos prontos”, finaliza.
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