A rua virou um drama para a esquerda brasileira. Afinal de contas, historicamente, sempre foi a dona do pedaço. Mas desde que foi atropelada pela direita em 2013, por razões que já renderam uma babel de teses de boteco e de mestrado, cada paralelepípedo sabe como tem sido difícil resolver esse trauma.
O triunfo de Lula em 2022, com a frente ampla, mesmo tendo mobilizado a maioria dos brasileiros, não funcionou como o emplasto Brás Cubas capaz de reduzir essa melancolia canhota.
Um desnível no Congresso, com larga vantagem da direita e do centro, complica ainda mais a situação, roubando do governo a possibilidade de pender um pouco mais para o lado dos desejos esquerdistas.
E a rua com isso?
Em uma reunião no dia 20 em SP, cinco dias antes do pedido de anistia de Jair Bolsonaro na avenida Paulista, as Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular decidiram convocar um dia nacional de mobilização pela prisão do ex-presidente.
A data foi marcada: 23 de março. Compareceram ao encontro, as mais importantes siglas de entidades, movimentos sociais e partidos: UNE, CUT, MTST, MST, MNU, CMP e MMM, PT, PSOL e PCdoB.
Começou desde então um saudável e importante debate. Importantíssimo. Estaria mesmo no momento certo da esquerda voltar ao asfalto? Essa pauta é correta, mobiliza?
Não seria uma cilada, com possibilidade de pouca gente, o que seria um desastre na comparação com os “reaças”? Correria o perigo também de virar um novo 2013 e ter a massa sequestrada pela direita? Poderia sobrar, na dispersão dos desejos e do barulho, para a gestão Lula?
Sigo com um mar de interrogações — esses anzóis ao contrário, repare no sinal gráfico, é só um detalhe.
Pedir ou exigir prisão de um ex-presidente é pauta de esquerda? Não seria melhor deixar correr na máxima legalidade, nas mãos do STF, Ministério Público Federal e PF? Lembre-se: é o processo legal que tem levado o bolsonarismo ao desespero.
É fazendo perguntas que obtemos algumas pistas para decidir o rumo de qualquer coisa. A esquerda não estaria pautando algo plebiscitário, desviando para a vontade das ruas um processo jurídico? Não é essa a vontade declarada no domingo (25) pelo próprio ex-presidente?
Vale pressionar o STF para adotar linha que lembra o avexamento lavajatista? Prender sem o cumprimento (demorado mesmo) do rito legal?
Pautar o jogo para a praça pública não seria vantagem de Bolsonaro, que tenta deslocar a sua defesa para o palanque? Repare que o capitão silencia no inquérito da PF e se defende na avenida que o levou ao poder.
Preste atenção também no que disse o presidente Lula, em entrevista ao repórter Kennedy Alencar, na Rede TV!: Bolsonaro está pedindo anistia mesmo antes de ser condenado. Sinais, fortes sinais.
Este reles cronista de rua, flâneur que domina a arte de chutar tampinhas, não vê vantagem da esquerda, nesse momento, fazer manifestações para disputar sobre prisão de político, mesmo que seja o maior dos crápulas do ramo. Seria acionar o “game” do cara.
Qualquer movimento esquerdista, como faz de modo permanente o MST, deve seguir politicamente na pressão para as grandes pautas sociais, como uma reforma agrária radical, por exemplo — uma luta que vem lá das Ligas Camponesas, no Nordeste dos anos 1950–60, e até agora não foi resolvida a contento e segundo a necessidade dos homens e mulheres do campo.
E você, que me deu a honra da leitura, o que acha? Importantíssima sua opinião nesse momento. É só subir no tamborete e deixar o seu recado.
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