Há poucos dias revi pela terceira ou quarta vez um grande clássico do cinema em preto de branco: “Doze homens e uma sentença” (Twelve angry men – 1957) é o título em português. O filme, além de repleto de atores extraordinários, nos mostra aquilo que hoje mais nos faz falta: o cultivo dos valores democráticos. Quando a violência privada aqui e nos Estados Unidos se torna um acontecimento diário e assustador, vale a pena rever e compreender este clássico.
Os doze homens do filme têm que decidir o destino de um adolescente de 18 anos que é – característica mais marcante – um porto-riquenho acusado de ter matado o pai que o espancava regularmente. Como pela regra do júri popular americano a decisão teria que ser unânime, toda a trama do filme se desenrola a partir do fato de que 11 dos 12 jurados já haviam decidido pela culpabilidade do garoto e apenas um, o personagem do impecável Henry Fonda, ainda não estava convencido da culpa.
De início, o preconceito xenófobo dita as cartas. A identificação do criminoso com o imigrante já ajuda a perceber o garoto como culpado. Outros queriam terminar logo com o julgamento para assistir ao jogo de futebol americano que aconteceria logo depois. Também isso comprova a ausência de qualquer empatia com relação ao garoto porto-riquenho.
É aqui que começa a saga do filme. Pouco a pouco, os argumentos da condenação vão perdendo validade a partir da livre discussão de argumentos. Cria-se uma atmosfera que passa a rejeitar a violência e o grito em nome do debate e da discussão livre. O processo de aprendizado que então se instaura põe a nu as motivações inconscientes de cada um dos jurados que legitimavam a xenofobia. Como todo real processo de aprendizado, ele é doloroso e desafiador e desvela as reais motivações, fruto da impotência e das frustrações pessoais, que estavam por trás da xenofobia.
É um filme que comprova a tese fundamental do grande filósofo Jürgen Habermas de que o livre debate baseado nos melhores argumentos é a pedra fundamental de qualquer processo democrático. E é precisamente o que está em risco hoje em dia. O projeto da extrema direita em escala mundial é um só: substituir o livre debate dos melhores argumentos pela violência simbólica e física.
O filme nos mostra, portanto, como num laboratório, como o funcionamento de todas as instancias e instituições democráticas modernas está ligado a este tipo de reflexão livre e racional coletiva. É a sua morte que devemos temer. Essa morte é hoje uma possibilidade não só real, mas, provável, desde que o planeta se torna cada vez mais dominado por uma meia dúzia de delinquentes chamados de bilionários, cujo principal objetivo é acabar com qualquer prática democrática, já que vicejam e se enriquecem no culto à violência.
Ah, o filme esta disponível na Amazon Prime para aluguel por R$ 11.
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