Por Rodrigo Vianna
Quase sete horas depois de o ICL Notícias publicar um extenso artigo, com descrição detalhada sobre a estranha apreensão de um celular do ex-perito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Eduardo Tagliaferro, a Folha de S. Paulo decidiu reagir.
O jornal paulista escolheu uma curiosa manchete para entrar no assunto: “Celular de ex-assessor do TSE que municiou inquéritos de Moraes foi lacrado após apreensão, diz BO”.
Jornalistas experientes entenderam a publicação da seguinte forma: a Folha passou um recibo gigante.
Vamos relembrar a história…
O ICL Notícias mostrou, nesta quinta-feira (15), que a Polícia Civil de São Paulo apreendeu e permaneceu pelo menos seis dias de posse do celular de Tagliaferro. O perito, que trabalhava para o ministro Alexandre de Moraes no TSE, foi preso no dia 8 de maio de 2023 por agredir a mulher na Grande São Paulo. A deputada bolsonarista Carla Zambelli foi informada da prisão, enquanto o assessor de Moraes ainda prestava depoimento na delegacia, e fez uma postagem sobre o fato na manhã do dia 9.
Tagliaferro foi um dos assessores citados em controversa reportagem da mesma Folha no início da semana, que reproduziu trocas de mensagens entre funcionários a serviço de Moraes. A matéria, assinada por Glenn Greenwald e Fábio Serapião, tentava demonstrar que o ministro usou estrutura do TSE para investigar golpistas ligados a Bolsonaro — mas sem seguir os devidos “ritos“, como definiu a Folha.
Detalhe: a matéria original de Glenn e Serapião omitiu o fato de que o celular de Tagliaferro fora apreendido pela polícia paulista, comandada pelo governador bolsonarista Tarcísio de Freitas. Só depois que o ICL Notícias trouxe os detalhes da apreensão é que a Folha respondeu, passando o imenso recibo.
O objetivo parece ser o de livrar a cara da polícia de do governador Tarcísio de Freitas: o celular de Tagliaferro foi de fato apreendido, admite agora o jornal, mas permaneceu “lacrado” na delegacia. Seria uma forma — de dizer que a polícia paulista não bisbilhotou o celular do então assessor de Moraes. Portanto, não seria a polícia de Tarcísio a origem da munição usada contra Moraes.
Recapitulemos os fatos: a polícia prendeu Tagliaferro no dia 8 de maio de 2023; Zambelli foi informada que um peixe grande ligado a Moraes tinha sido fisgado, e de forma afoita deu publicidade ao fato no dia 9; nesse mesmo dia 9, a polícia requisitou o celular do assessor fisgado mas… numa ação pura e angelical… decidiu lacrar o aparelho, que permaneceu intocado numa gaveta.
A Folha quer que os leitores acreditem nessa fábula?
Por que a polícia apreenderia um celular que permaneceria “lacrado”? Para zelar por ele? Para trocar a capa do aparelho? Para recarregar a bateria do telefone na delegacia?
Hum…
A Folha embarcou numa canoa furada ao publicar a tese mal ajambrada de que Moraes agiu “fora do rito”. Dobrou a aposta, dois dias depois, ao endossar a ideia de que um Moraes “fora do rito” enseja nulidade das investigações contra Bolsonaro, o que deixou a extrema direita em feliz alvoroço.
Juristas rapidamente desmontaram as falácias da Folha. Mas o jornal insiste, e agora tenta vender a história de um celular “lacrado”.
É evidente que Glenn e Serapião têm o direito — e até o dever — de proteger as fontes que forneceram a matéria-prima de sua reportagem. Isso não se discute.
Mas podemos discutir, sim, a má qualidade de um jornalismo que tenta torcer os fatos, até que eles caibam em suas teses. E age assim, sabendo que isso favorece o movimento de uma extrema direita autoritária e golpista.
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