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Prefeita bolsonarista entrou na Justiça na Bahia para não ser associada a Bolsonaro

Candidata à reeleição, Sheila Lemos não quer a imagem vinculada ao ex-presidente, para quem fez campanha em 2022
04/10/2024 | 10h59

Por André Uzêda*

Terceiro maior colégio eleitoral da Bahia, a cidade de Vitória da Conquista, no sudoeste do estado, vive uma eleição completamente judicializada até aqui. A atual prefeita, Sheila Lemos (União Brasil), foi considerada inelegível por 4 votos a 3, em decisão proferida em 23 de setembro deste ano pelo Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA).

Enquanto ainda aguarda recurso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a atual prefeita mantém seu nome inscrito na urna eletrônica e tem até liderado as pesquisas de intenção de voto na cidade.

Este, no entanto, não é o único processo que marca a eleição em Vitória da Conquista. Em 12 de setembro, a equipe jurídica de Sheila Lemos ingressou com uma ação na Justiça Eleitoral pedindo que fosse removida qualquer propaganda que a associasse ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

A ação foi direcionada à campanha de Waldenor Pereira, candidato do PT e que, no Instagram, publicou um post afirmando que “Sheila Lemos é Bolsonaro”. Esta ação ainda está sendo apreciada na Justiça.

Na peça, a equipe de Sheila pede que “os representados se abstenham de fazer novas publicações” sobre esse tema, além de citar que a prefeita “não possui qualquer vínculo político-eleitoral com o ex-presidente”.

Mas isso não é exatamente verdade. Na eleição presidencial de 2022, Sheila Lemos apoiou abertamente Jair Bolsonaro no segundo turno.

Em um vídeo de campanha ao qual se dirige à população de Conquista, a atual gestora diz que  “para nossa cidade, o que melhor podemos fazer neste segundo turno é intensificar a campanha de ACM Neto, aumentar sua votação para governador, e apoiar a reeleição do presidente Bolsonaro, como forma de garantir o desenvolvimento que tanto queremos para nossa cidade”.

Nessa mesma gravação, Sheila ainda convidou para um evento de campanha ao lado de dois ministros que ocuparam cargos de destaque no governo Bolsonaro: João Roma, ex-titular do Ministério da Cidadania, e Damares Alves, ex-líder da pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos.

Ao fim do segundo turno, tanto ACM Neto quanto Bolsonaro acabaram derrotados por dois candidatos petistas: Jerônimo Rodrigues e Lula.

Prefeita Sheila Lemos não diz em quem votou para presidente em 2022

Prefeita não revela voto para presidente

Durante o primeiro turno, quando questionada, Sheila Lemos não quis revelar seu voto à Presidência. Em um vídeo, um repórter pergunta se ela tinha anulado o voto, o que prontamente nega.

Disse que não revelaria seu candidato, porque “o voto é secreto”. O repórter insiste e pergunta se, pelo fato dela andar ao lado de muitos bolsonaristas, teria votado no ex-presidente. Sheila diz que “prefere não comentar” e, aos risos, volta a afirmar que “o voto é secreto”.

Na peça jurídica elaborada pela equipe de campanha de Sheila este ano, é citado abertamente a impopularidade de Bolsonaro junto ao eleitorado baiano, e que isso seria uma estratégia do PT local para prejudicar a imagem da prefeita.

“É possível afirmar, assim, que o ex-presidente possui uma imagem negativa junto à maioria da população baiana. Assim, a tentativa de associar a figura da candidata à imagem do ex-presidente é uma estratégia que busca gerar impactos negativos à atual prefeita de Vitória da Conquista”, diz trecho do documento.

Isso, de fato, é verdade. No segundo turno das eleições presidenciais, Lula teve 72,12% dos votos válidos na Bahia. Bolsonaro teve 27,88%. Foi o segundo melhor desempenho, em porcentagem, de todo país — atrás apenas do Piauí, onde o petista teve 76,84% dos votos.

Na Bahia, Lula venceu em 415 dos 417 municípios do estado. Em Conquista, o petista teve 58,31% dos votos, contra 41,69% do ex-capitão.

Outro lado

O ICL Notícias falou com um dos coordenadores de comunicação da campanha de Sheila Lemos, que atribuiu a propaganda a uma tentativa da oposição de ligar a prefeita ao número de mortes da pandemia no Brasil.

“O pedido de retirada da peça não tem a ver simplesmente com Bolsonaro. A oposição quer ligar as mortes da pandemia com o surto de dengue na cidade, sendo que são fatos que não possuem qualquer relação de casualidade”, rebateu Lucas Caires.

Questionado sobre o fato da prefeita ter feito campanha aberta para o ex-presidente e, na peça jurídica dizer que “não possui qualquer vínculo com o ex-presidente”, Caires disse que Sheila tem “a maior frente partidária destas eleições”. Ela construiu uma frente de direita com muitas candidaturas, mas é uma figura autônoma”.

O assessor disse ainda que Waldenor Pereira tenta nacionalizar a disputa, porque “não tem projeto para a cidade”.

Eleição instável com prefeita inelegível

A ação que tornou a prefeita Sheila Lemos inelegível trata da possibilidade dela emendar três mandatos consecutivos “vinculado ao mesmo grupo familiar”, conforme consta no artigo 14 da Constituição Federal. O entendimento foi do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA).

Isso porque, em 18 de dezembro de 2020, Irma Lemos assumiu a prefeitura da cidade por 13 dias, após o afastamento do prefeito Herzem Gusmão (MDB), que tratava da covid-19. Em 31 de dezembro, ela entregou o cargo na condição de prefeita interina.

Irma Lemos é mãe de Sheila e foi vice-prefeita no primeiro mandato de Herzem. Em outubro de 2020, antes de se licenciar, Herzem ganhou a eleição trocando a filha pela mãe na indicação de vice da chapa.

Em março de 2021, Herzem Gusmão morreu em decorrência da covid-19. Durante a pandemia, ele tinha defendido o tratamento precoce e a cloroquina. Com a morte dele, Sheila assumiu o cargo definitivamente como prefeita.

“O que a Justiça entende é que Irma Lemos [mãe de Sheila] foi prefeita, mesmo tendo assumido apenas 13 dias. Já Sheila completou um mandato inteiro. Caso vença agora, seriam três mandatos consecutivos da família, o que é vedado pela Constituição”, diz Alexandre Pereira, advogado da chapa do petista Waldenor Pereira.

A equipe jurídica da atual prefeita recorreu do processo no Tribunal Superior Eleitoral. Enquanto a decisão não sai, o nome dela continua inscrito na urna e ela pode continuar fazendo campanha. Caso avance para o segundo turno, a mesma situação se repete, até decisão do TSE.

Se vencer as eleições, mas o TSE entender que a chapa de Sheila está inelegível, novas eleições suplementares serão convocadas na cidade em até 40 dias.

“O nome de Sheila Lemos consta na urna eletrônica. A candidatura dela foi deferida quando foi feita a inscrição da chapa. Quando o PT tentou derrubar, o juiz eleitoral de primeira instância garantiu a inscrição dela. Ou seja, estamos tranquilos que, vencendo a eleição, teremos toda a condição de assumir o mandato”, diz Caires, da coordenação de campanha.

Em pesquisa divulgada pelo Gasparetto Pesquisas e Estatísticas, Sheila Lemos lidera com 56,99% das intenções de voto. Waldenor Pereira marca 15,97%, empatado tecnicamente com Lúcia Rocha (MDB), que aparece com 13,07%.

Vitória da Conquista foi administrada pelo PT durante cinco mandatos consecutivos, até Herzem Gusmão interromper o ciclo, em 2016. Era o mais antigo reduto do partido na Bahia, juntamente com a cidade de Pintadas — onde a legenda também foi derrotada no mesmo ano.

Nos anos 1990, Conquista se tornou uma das principais vitrines do PT, com a primeira eleição de Guilherme Menezes.

*Especial para o ICL Notícias

 

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