Na decisão em que concorda com o pedido da Polícia Federal para prender Braga Netto, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), diz que o depoimento de Mauro Cid apresentou elementos que permitem caracterizar a existência de conduta dolosa do general “no sentido de impedir ou embaraçar as investigações em curso”.
Moraes relata que a PF detalhou “diversos elementos de prova” que evidenciam que Braga Netto atuou, dolosamente, “para impedir a total elucidação dos fatos, notadamente por meio de atuação concreta para a obtenção de dados fornecidos” por Mauro Cid em sua colaboração premiada, “com o objetivo de controlar as informações fornecidas, alterar a realidade dos fatos apurados, além de consolidar o alinhamento de versões entre os investigados”.
O documento cita a perícia realizada no celular apreendido com Mauro Cesar Lourena Cid, pai de Mauro Cid, onde foi constatada intensa troca de mensagens com Braga Netto, “bem como que TODAS AS MENSAGENS TROCADAS POR MEIO DO APLICATIVO WHATSAPP FORAM APAGADAS nas primeiras horas do dia 8/8/2023, três dias antes da denominada operação “Lucas 12:2”, que apurou as ações do grupo criminoso relativas ao desvio de presentes de alto valor — joias — recebidos em razão do cargo pelo ex-presidente da República JAIR MESSAIS BOLSONARO e por comitivas do governo brasileiro”.
A perícia demonstrou, também, que, no dia 7 de agosto de 2023, Mauro César Lourena Cid manteve diversas interações com Braga Netto por meio do WhatsApp.
“Essas interações se relacionam, no mesmo contexto, com trocas de mensagens realizadas no dia 12/9/2023 entre o indiciado Mário Fernandes e o coronel reformado Jorge Kormann. No diálogo entre os dois, Fernandes relata a Kormann que os pais de Mauro César Cid ligaram para os generais Walter Braga Netto e Augusto Heleno informando que ‘é tudo mentira’, possivelmente sobre as matérias divulgadas pela imprensa sobre o acordo de colaboração.
A conversa ocorreu três dias após decisão de homologação do acordo de colaboração premiada firmado entre a Polícia Federal e Mauro Cid, fato que indica, segundo a autoridade policial “que o General BRAGA NETTO tentou obter os dados do acordo através de familiares do colaborador e que a informação chegou ao investigado MARIO FERNANDES, como forma de tranquilizar os demais integrantes da organização criminosa de que os fatos relativos aos mesmos não estariam sendo repassados à investigação”.
Segundo a Polícia Federal, a investigação demonstra que os contatos telefônicos realizados com Mauro César Lourena Cid tinham a finalidade de obter dados sigilosos, controlar o que seria repassado à investigação, e, ao que tudo indica, manter informados os demais integrantes da organização criminosa.
A autoridade policial ressalta, também, que em 8 de fevereiro de 2024, dia da deflagração da denominada operação “Tempus Veritatis”, autorizada pelo STF, “foi identificado na sede do Partido Liberal (PL), sob a mesa do coronel FLÁVIO BOTELHO PEREGRINO, assessor do general BRAGA NETTO, documento com perguntas e respostas acerca da colaboração premiada realizada pelo investigado MAURO CID”.
O documento apreendido pela Polícia Federal indica terem sido feitas perguntas por Braga Netto sobre o conteúdo do acordo de colaboração premiada firmado por Mauro Cid com a Polícia Federal, que teriam sido respondidas pelo próprio colaborador. O documento foi apreendido na mesa de trabalho de um dos assessores de Braga Netto na sede do Partido Liberal (PL) e diz respeito, primordialmente, ao que teria sido revelado sobre a participação do referido investigado, indicando a tentativa de obtenção de dados sigilosos da colaboração com a finalidade de obstruir as investigações, o que o colaborador Mauro Cid confirmou em seu novo depoimento.
Na oitiva, realizada na Polícia Federal, em 5 de fevereiro de 2024, Mauro Cid confirmou que Braga Netto tentou obter os dados sigilosos relativos ao acordo de colaboração premiada com seu pai em contatos telefônicos realizados no período em que o acordo estava sendo firmado.
Destaca, ainda, que, além dessas novas provas indicarem a atuação dolosa de Braga Netto na tentativa de obstrução da investigação, o novo depoimento do colaborador Mauro Cid, no dia 21 de novembro, — corroborado por documentos juntados aos autos — “aponta que foi Braga Netto quem obteve e entregou os recursos necessários para a organização e execução da operação ‘Punhal Verde e Amarel’” — evento ‘COPA 2022’.
No dia 19 de novembro, em virtude das contradições existentes entre os depoimentos do colaborador e as investigações realizadas pela Polícia Federal, Moraes designou a realização de audiência para oitiva de Mauro Cid, no dia 21 de novembro, no STF, “para esclarecimentos relacionados à manutenção ou não da colaboração premiada e a confirmação de sua regularidade, legalidade, adequação e voluntariedade”.
Nessa audiência Mauro Cid apresentou novos elementos importantes sobre as circunstâncias da reunião ocorrida em 12 de novembro de 2022 na residência de Braga Netto.
Ele falou em especial de fatos relacionados ao financiamento das ações de forças especiais por Braga Netto, afirmando que “o general repassou diretamente ao então Major RAFAEL DE OLIVEIRA dinheiro em uma sacola de vinho, que serviria para o financiamento das despesas necessárias a realização da operação”. A informação foi publicada em primeira mão por Juliana Dal Piva em sua coluna no ICL Notícias.
Diante dessas evidências, Moraes decidiu concordar com a prisão preventiva do general e busca e apreensão em sua residência, levando em conta que “nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal, é possível a restrição excepcional da liberdade de ir e vir, pois a Polícia Federal demonstrou a presença dos requisito necessários e suficientes para a decretação da prisão preventiva do investigado como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal, comprovando a materialidade e fortes indícios de autoria dos tipos penais de tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito (CP, art. 359-L), de tentativa de golpe de Estado (CP, art. 359-M) e de organização criminosa (Lei 12.850/13, art. 2º), em concurso material de delitos (CP, art. 69) e apontando o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, em constante tentativa de embaraço às investigações (Lei 12.850, art. 2º, § 1º)”.
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