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Por Gabriel Gomes*

Em vigor desde o dia 18 de setembro de 2020, a lei 13.709, mais conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) tem registrado a cada ano uma utilização maior pelo Poder Judiciário brasileiro. No ano de 2023, o número de decisões judiciais com base na legislação de forma predominante cresceu 81,4%, na comparação com o ano anterior.

Em números absolutos, as decisões com uso da lei saltaram de 665, em 2022, para 1.206 no ano passado. Os dados foram adiantados pelo Painel LGPD, estudo promovido pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e o Jusbrasil. A pesquisa completa com as informações do ano de 2023 deve ser divulgada nos próximos meses.

A maior utilização da LGPD faz parte do processo de difusão e popularização do texto, em vigor há cerca de quatro anos. Segundo a advogada Laura Schertel Mendes, coordenadora científica do Painel LGPD, o aumento dos números é um processo “natural”.

“Quando uma lei acaba de ser aprovada e entra em vigor, é natural que haja um tempo para que todos os operadores do Direito, sejam os advogados, integrantes do Judiciário ou os cidadãos percebam as mudanças. A gente tinha algumas outras legislações, como o Código de Defesa do Consumidor, que muitas vezes eram utilizadas para situações semelhantes. É um processo de amadurecimento natural essa maior aplicação”, comentou a advogada.

Foto: Agência Brasil

USOS DA LEI

Ao estabelecer diretrizes para a coleta, processamento e armazenamento de informações pessoais, a lei busca criar uma “cultura de proteção de dados” no Brasil. Com isso, uma das principais características da LGPD, como aponta a advogada Laura Schertel, é a transversalidade, já que pode ser utilizada em diversas áreas.

Um dos usos mais identificados é no direito trabalhista, para impedir o uso excessivo de dados pessoais por parte dos empregadores. Em muitos casos, o trabalhador questiona na Justiça, com resposta positiva, na maioria das vezes, à utilização de informações de geolocalização para comprovação da jornada de trabalho.

“A gente percebe que, muitas vezes, quando o empregador faz esse pedido, o Judiciário tem negado, dizendo: ‘Olha, você tem métodos menos invasivos de comprovar isso, não faz sentido você violar a intimidade e a privacidade da pessoa, não teria base legal para fazer esse pedido’”, explica Laura Schertel.

O direito à privacidade dos trabalhadores de aplicativos também é contemplado pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. Muitos motoristas e entregadores questionam e pedem revisões de decisões automatizadas das empresas. A questão é tratada no artigo 20 da lei, que garante o direito “a solicitar a revisão de decisões tomadas unicamente com base em tratamento automatizado de dados pessoais”.

Muitas vezes, no entanto, os pedidos têm sido negados pelo Judiciário, por vir acompanhado de questões de relações trabalhistas, como a existência ou não de vínculo empregatício entre os aplicativos e os trabalhadores.

“Nós achamos curiosas essas decisões porque são questões muito independentes, a LGPD não está vinculada a discussão se existe vínculo trabalhista ou não. É um direito ainda pouco conhecido do Judiciário brasileiro e certamente poderia ser aplicado para esclarecer certas situações em que há decisões automatizadas e a empresa poderia, sim, passar e informar os critérios e fazer a revisão, quando for o caso”, salientou Laura Schertel.

Para além dos aplicativos, o Painel LGPD também identificou muitas decisões ligadas a fraudes bancárias, sejam elas ligadas a vazamentos ou não. Outra discussão na aplicação da lei se dá nos vazamentos de dados sensíveis, se há a obrigação de indenização ou não. “A lei não faz nenhum tipo de diferenciação quando se fala de dados pessoais sensíveis ou não-sensíveis, não há nenhum tipo de diferenciação em termos de responsabilidade. Mas, a gente tem visto que o Judiciário tem feito essa diferenciação”, explica Laura Schertel.

Foto: Marcelo Casal Jr./ Agência Brasil

DIREITOS

A Lei Geral de Proteção de Dados garante ao cidadão o direito de se informar sobre as informações pessoais coletadas e sobre de que modo elas são coletadas. A lei ainda permite a solicitação da correção de dados incompletos e até mesmo da exclusão desses. “Esses direitos visam dar mais poder aos indivíduos sobre suas informações pessoais”, define a advogada e especialista em Segurança da Informação e DPO, Adrianne Lima.

Adrianne definiu um passo a passo para os cidadãos, titulares de dados, exercerem seus direitos de acordo com o texto da lei.

“Esse passo a passo visa orientar os titulares de dados sobre como exercer seus direitos de maneira eficaz, proporcionando uma abordagem escalonada para resolver questões relacionadas à proteção de dados”, explica Adrianne Lima.

Confira o passo a passo:

  • Contato com a empresa (via Canal do DPO): o titular deve inicialmente entrar em contato com a empresa por meio do canal designado pelo Encarregado de Proteção de Dados (DPO) disponível no site da empresa. Esse canal é especificamente destinado para questões relacionadas à proteção de dados.
  • Solicitação específica: ao contatar a empresa, o titular deve fazer uma solicitação específica, como pedir acesso aos seus dados, corrigir informações incorretas, ou solicitar a exclusão de dados, conforme seus direitos garantidos pela LGPD.
  • Registro e resposta da empresa: a empresa é obrigada a registrar a solicitação e responder dentro do prazo estabelecido pela legislação. A resposta deve ser clara e detalhada, indicando as ações tomadas ou explicando os motivos para não atender à solicitação.
  • Reclamação à ANPD ou ao Poder Judiciário: caso a resposta da empresa seja insatisfatória, genérica ou não seja recebida no prazo legal, o titular pode buscar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) para realizar uma reclamação administrativa. Alternativamente, o titular pode recorrer ao Poder Judiciário para buscar uma solução legal para seu caso, se necessário.

*Gabriel Gomes é estagiário, sob supervisão de Chico Alves

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