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A leitura nacional destas eleições faz-se em São Paulo. Talvez isto seja injusto para o resto do Brasil e para alguns partidos de direita que tiveram mais prefeitos, mais votos e mais vereadores eleitos, mas a política é o que é — será a eleição de São Paulo a definir as novas lideranças nacionais e talvez isso seja o mais importante para o futuro.

A primeira liderança está encontrada — Pablo Marçal será candidato presidencial em 2026 e com esse gesto desafia abertamente Bolsonaro e a sua família. Ele não quer seguir, mas liderar. Ele quer ser o chefe, o novo chefe, o novo mito. Esta é uma das consequências das eleições de São Paulo — a guerra civil dentro da extrema direita não chegou ao fim. A noite de ontem foi só o fim do princípio.

Depois temos Guilherme Boulos. A noite eleitoral consagrou Guilherme Boulos e a minha impressão é que a sucessão de Lula na esquerda brasileira está encontrada. É certo que este candidato já tinha ganho as suas esporas na eleição passada, mas esta eleição foi mais difícil.

Boulos resistiu ao declínio da esquerda, teve mais de 1 milhão e 700 mil votos e parte para o segundo turno oferecendo à cidade a alternativa de mudança. Quem acompanhou a eleição sabe que era impossível fazer melhor. Sabe que Boulos se afirmou como candidato preparado e como liderança popular. E sabe também que qualquer outro candidato menos combativo teria soçobrado. Este primeiro turno foi impiedoso —, e Boulos enfrentou-o com coragem. Desce agora à arena do combate do segundo turno com uma boa expectativa de vitória.

E Ricardo Nunes? Será justo deixar Ricardo Nunes de fora da análise da noite eleitoral? Afinal de contas, dirão, foi ele que terminou em primeiro. Por pouco, mas foi ele. E, no entanto, há noites em que só temos olhos para os vencidos porque sabemos, sabemos muito bem, que serão estes vencidos a construir o futuro, não os que agora ficaram à frente.

Ricardo Nunes não ficará na história desta noite porque foi uma candidatura do aparelho — nasceu do aparelho, cresceu com o aparelho e tudo deve ao aparelho. A crueldade dos jornalistas foi tão longe que todos atribuíram a vitória não a ele, mas ao governador. Sem o apoio do governador não teria ido ao segundo turno e todos temos impressão de que há nesta análise um grande fundo de verdade. Nada naquela votação se deve pessoalmente ao candidato, mas ao aparelho que o apoiava. Sim, a política pode ser impiedosa com os vencidos, mas também o é com os vencedores — sobretudo quando pressente que quem chegou na frente não fará parte do futuro.

Seja como for, o cenário do segundo turno está assim montado — de um lado a continuidade, do outro a mudança. Esta é a disputa programática que estará agora em jogo na eleição. Quem está satisfeito com a política da cidade votará num candidato, quem ambiciona uma mudança votará no outro. A propósito, e antes que me esqueça, deixem-me sublinhar a atitude de grandeza da candidata Tabata Amaral ao declarar o seu voto em Guilherme Boulos. Foi uma candidata pela mudança, agora é uma eleitora da mudança — nada a negociar. Bravo.

E, no entanto, há uma outra diferença nesta eleição que não tem a ver nem com programas, nem com propostas, nem com linhas políticas. Tem a ver com a liderança. De um lado estará um candidato com uma história singular de vida política, do outro estará um candidato do aparelho; de um lado estará quem fez toda a sua carreira liderando, do outro estará quem fez uma carreira apoiando outros; de um lado estará alguém a quem nada foi oferecido na política e que tudo teve que conquistar, do outro estará alguém de quem não se poderá dizer o mesmo.

Enfim, sem querer ser injusto com ninguém, julgo que podemos dizer que de um lado estará uma liderança, do outro uma máquina política. Assim começa a batalha final da eleição de São Paulo.

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