O deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) registrou nesta quinta-feira (28) ação popular na 2ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal contra o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. O parlamentar acusa Campos Neto de prejudicar deliberadamente a economia brasileira ao, entre outros atos, pressionar para a manutenção da alta taxa de juros Selic e ao não fazer com que o BC intervenha no mercado para evitar a especulação com dólares, como tem acontecido nos últimos dias.
Na ação (acesse o texto aqui), assinada pelo advogado Ramon Arnus Koele, Boulos sustenta que o presidente do BC age assim basicamente devido a três motivos: por ser adversário político do atual governo; por ter interesse de agradar ao mercado financeiro, para onde vai voltar assim que deixar o comando da instituição e por lucrar com a alta do dólar em seus investimentos em empresas offshores no exterior.
Diante disso, o autor pede à Controladoria Geral da União que determine que ele se abstenha de atuar em processos administrativos ou jurídicos relativos ao mercado financeiro até o fim do mandato, que não participe das reuniões do Conselho de Política Monetária (Copom), que seja determinada a quebra do sigilo bancário, fiscal e telemático de Campos Neto e que ao fim da ação “seja declarada a invalidade de todas as decisões, por incapacidade subjetiva e desvio de finalidade, tomadas por Campos Neto, de forma individual ou colegiada, sobre a taxa de juros no Brasil ao longo de sua gestão”.
A ação pede também condenação do Banco Central e de Campos Neto ao pagamento de perdas e danos pelos prejuízos causados ao país.
Investimentos de Campos Neto
Na peça, é demonstrado que a maior parte do patrimônio de Campos Neto está investida em ativos de renda fixa. “Como se sabe, ativos de renda fixa estão atrelados ao pagamento de juros. Investe-se uma quantia e, sobre ela, existe uma remuneração pré-estabelecida, que pode ser uma porcentagem específica ou a variação de determinado índice financeiro fixado de antemão”. A seguir, o texto destaca que “a taxa básica de juros, a SELIC, é um dos, senão o principal elemento que interfere na remuneração dos títulos públicos e privados de renda fixa”, o que demonstra conflito de interesses.
“Em bom português: quanto mais Campos Neto sobe a SELIC, ou evita nela fazer cortes, mais se valorizam seus fabulosos investimentos em renda fixa”, diz a ação.
O advogado de Boulos ressalta também que Campos Neto deixou de explicar o que, efetivamente, há nas empresas offshore de Campos Neto, e como ele chegou aos valores declarados. “Isto é, se eles representam o capital social atribuído a essas sociedades — elemento meramente contábil e formal, dissociado do valor ‘de mercado’ desses bens –, se correspondem ao seu valor contábil, ao valor patrimonial etc”.
Argumenta que é possível, e até provável, “que a Peacock Assets, por exemplo, sediada nas Bahamas e administrada pelo Banco Goldman Sachs, apresente somente um valor contábil de pouco mais de R$ 5 milhões, declarado apenas para fins fiscais, mas que, sob sua gestão, estejam outras empresas offshore ou outros aIvos muito mais valiosos.”
A ação questiona: em que consistiriam esses ativos? Qual a “ponta final” dos investimentos do presidente do Banco Central? Estariam eles atrelados também à taxa SELIC? Ou estariam vinculados a empresas de qualquer maneira beneficiadas ou prejudicadas pela atuação de Campos Neto na autarquia nacional?”
A conclusão é que, pelas informações prestadas, não há como saber.
Vinculação política
Há também na parte inicial da ação uma extensa exposição de fatos que demonstram a conhecida ligação política de Campos Neto com o ex-presidente Jair Bolsonaro, responsável por sua indicação ao cargo. Desde o fato de ter ido votar com camisa verde e amarela, vinculada ao bolsonarismo, até participação frequente em encontros íntimos desse grupo político.
“O caso de Campos Neto exemplifica os desafios de consolidar padrões de conduta em uma função de autonomia tão recente. Enquanto suas ações reforçam suspeitas de politização do Banco Central, elas também escancaram as lacunas existentes no arcabouço ético e institucional que deveria guiar sua atuação”, diz o texto.
Sobre esse tema, conclui que “em última análise, o legado de Campos Neto não será apenas avaliado por suas decisões técnicas, mas também pelo impacto de suas escolhas políticas na credibilidade do Banco Central. Sua gestão levanta um alerta crucial: a autonomia da autoridade monetária é uma conquista que só será plenamente efetiva se for acompanhada de um compromisso rigoroso com a neutralidade e a ética. Campos Neto,
ao cruzar repetidamente essas linhas tênues, deixa um precedente preocupante para seus sucessores”.
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