Em meio à crescente dificuldade do governo Lula (PT) para aprovar projetos no Congresso, a ampliação da faixa de isenção de IR (Imposto de Renda) — uma das promessas mais populares da gestão — virou instrumento de barganha política. Parlamentares decidiram atrelar a medida à ampliação do número de deputados federais e à retomada de verbas do famigerado orçamento secreto, em mais um episódio que evidencia a pressão imposta pelo Legislativo sobre o Executivo.
Na quinta-feira (12), a Comissão Mista de Orçamento (CMO) aprovou um projeto do governo que altera a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e abre caminho para tornar definitiva a proposta de isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil mensais.
Porém, o avanço do texto da isenção do IR não veio sem contrapartidas. Dois “jabutis” (medidas estranhas ao tema original) foram embutidos no projeto: a autorização para criação de novas cadeiras na Câmara dos Deputados e a reabilitação de dispositivos do orçamento secreto, cancelados no início do governo Lula.
O governo propôs o início da nova faixa de isenção de IR em 2026, com compensação por meio de uma taxação mais elevada para quem recebe acima de R$ 50 mil. No entanto, enquanto há acordo político em torno do alívio tributário para a população de renda média, parlamentares resistem à contrapartida que recai sobre os mais ricos.
A relatoria do projeto de isenção de IR segue nas mãos do ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), peça-chave nas negociações.
Isenção de IR: pacote aprovado em comissão prevê criação de novas vagas
O pacote aprovado pela CMO também dá aval para que o Orçamento de 2025 já contemple, de forma genérica, a criação de 18 novas vagas na Câmara, elevando o número de deputados dos atuais 513 para 531 a partir de 2027 — um aumento que deve custar R$ 64,8 milhões por ano aos cofres públicos.
A manobra permite incluir a despesa mesmo antes de a proposta ter passado pelo Senado, e sem detalhar o impacto financeiro de longo prazo.
Além disso, o projeto aprovado na comissão retoma dispositivos de uso controverso de emendas parlamentares. O texto autoriza que até municípios inadimplentes com a União ou obras sem licenciamento ambiental recebam recursos anteriormente vetados por Lula. São cerca de R$ 2 bilhões que haviam sido cancelados em dezembro de 2024 e agora voltam à cena, sob novo rótulo, mas com o mesmo DNA do orçamento secreto.
Dificuldades das prefeituras?
Para lideranças do Congresso, trata-se de uma resposta às dificuldades enfrentadas por prefeituras para acessar verbas. Mas, na prática, a medida reabre as comportas para a destinação de recursos sem critérios técnicos e com forte viés eleitoral. Foi devido à falta de transparência que as emendas entraram na mira do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino.
O episódio revela uma dinâmica preocupante: o governo, fragilizado em sua articulação política, vê-se obrigado a ceder em temas sensíveis para avançar com propostas de apelo popular.
A troca de favores, embora habitual na política brasileira, ganha novos contornos à medida que interesses legislativos se sobrepõem a metas fiscais, transparência e planejamento de longo prazo. A promessa de justiça tributária corre o risco de ser capturada por uma lógica de curto prazo e alto custo institucional.
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