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Por Mateus Coutinho — Brasil de Fato

O atual ministro dos Esportes, André Fufuca (PP), foi o responsável por indicar a verba de emenda parlamentar para custear um convênio entre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e a cidade de Alto Alegre do Pindaré (MA), governada por seu pai, Fufuca Dantas (PP), para obras de melhorias de estradas no município.

Como revelou o Brasil de Fato, foi no âmbito desse convênio que o pai de Fufuca contratou, em 2021, a empresa de Caio Rubens Vieira da Silva, jovem de 23 anos que é investigado pela Polícia Federal por suspeita de compra de voto para Fufuca na eleição de 2018. No celular de Caio, a PF encontrou, entre outras evidências, uma conversa em que ele negocia voto em troca de chuteira de futebol, em 2018.

É a primeira vez, desde as revelações do Brasil de Fato, que há a confirmação de que o ministro dos Esportes indicou emenda parlamentar para um contrato que acabou sendo celebrado com a Projeplan, a empresa de Caio. A empresa tem contratos com várias prefeituras pelo interior do Maranhão que somam milhões de reais. Alguns desses contratos são custeados com verbas de órgãos federais.

Ofício de André Fufuca indicando verba para a prefeitura governada por seu pai (Reprodução)

Fufuca: nota de empenho

O Brasil de Fato teve acesso, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), ao procedimento da Codevasf que levou à formalização do convênio. No processo está o registro de que a proposta partiu do gabinete do então deputado federal André Fufuca (PP).

Em 29 de dezembro de 2020, o gabinete do parlamentar encaminhou um ofício ao então presidente da Codevasf, Marcelo Andrade Moreira Pinto, solicitando que Alto Alegre do Pindaré, cidade governada pelo seu pai, recebesse R$ 3 milhões de emenda parlamentar. O objetivo era uma proposta de melhoria de estradas que havia sido apresentada pelo município em 26 de dezembro daquele ano (três dias antes do pedido de Fufuca) na Siconv, plataforma do governo federal para a formalização de convênios.

Em dois dias, as áreas técnica e jurídica da Superintendência Regional da Codevasf no Maranhão se manifestaram favoravelmente à celebração do convênio, mesmo sem terem sido apresentados vários documentos necessários para obras do tipo, como licenciamento ambiental e projeto básico. Ainda assim, a proposta foi assinada por essa mesma Superintendência em 31 de dezembro daquele ano.

Em 13 de janeiro de 2021, a Diretoria Executiva da Codevasf convalida a formalização do convênio, no valor total de R$ 2,87 milhões. Uma porcentagem do valor total indicado por Fufuca, de R$ 3 milhões, ficou para a própria Codevasf para gastos administrativos da empresa, como ele mesmo havia indicado em seu pedido.

Além de aparecer como responsável por indicar o recurso à Codevasf, o nome de Fufuca consta ainda em outros documentos internos da companhia que viabilizaram o convênio e na própria nota de empenho que foi emitida para o convênio. O documento deixa claro que o recurso foi direcionado a pedido do parlamentar por meio de verba de crédito suplementar aberto no orçamento da União naquele ano.

Codevasf menciona Fufuca no pedido de empenho da verba. Foto: Reprodução

O pedido de crédito suplementar, isto é, mais dinheiro para o orçamento daquele ano, veio no Projeto de Lei do Congresso Nacional 30/2020, aprovado em novembro de 2020 e que liberou R$ 6,1 bilhões para diferentes iniciativas, incluindo gastos com a Codevasf.

Como veio a ser revelado anos mais tarde, a Codevasf estava no centro do esquema de distribuição de emendas parlamentares secretas para atender políticos da base do governo Bolsonaro. No caso deste contrato citado na reportagem, a empresa informou em 2023, por meio de sua assessoria de imprensa, que a emenda parlamentar que custeou o convênio era uma emenda de relator — indicação de destinação de verba feita pelo relator do orçamento que não deixa claro quem é o verdadeiro autor do pedido. A prática, adotada no esquema do orçamento secreto, acabou sendo considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Os documentos oficiais da elaboração do convênio da Codevasf com Alto Alegre de Pindaré, porém, deixam claro que a indicação partiu de Fufuca.

Licitação com reajuste de 46%

A partir da assinatura do convênio, o procedimento licitatório teve seus desdobramentos que, como já mostrou o Brasil de Fato, culminaram na contratação da Projeplan em novembro de 2021, no valor de R$ 1,9 milhão e que em menos de dois anos foi reajustado em 46%, chegando a R$ 2,87 milhões, justamente o valor solicitado inicialmente por Fufuca e previsto no convênio aprovado pela Codevasf.

De acordo com os dados mais recentes disponibilizados no portal da transparência da prefeitura de Alto Alegre do Pindaré, a Projeplan fechou um total de seis contratos com o município entre abril de 2020 e novembro de 2021, que somam R$ 7,6 milhões. Apenas o contrato citado nesta reportagem tem verbas da Codevasf.

Em seu perfil oficial no Instagram, a prefeitura de Alto Alegre do Pindaré, município de 25,7 mil habitantes, afirma possuir  o “maior programa de asfaltamento do interior do Maranhão”.

Outro lado

Quando foi questionado pela reportagem, em dezembro de 2023, se foi responsável por indicar a emenda, a assessoria do Ministério do Esporte informou que “não cabe ao ministro André Fufuca emitir opinião sobre assuntos que dizem respeito às atividades da Codevasf ou da Prefeitura de Alto Alegre do Pindaré. Questionamentos ou esclarecimentos de dúvidas devem ser feitos diretamente às duas instituições”.

Procurado novamente nesta terça-feira (2), após a confirmação de que ele era o autor da emenda que possibilitou a execução do convênio, a assessoria do ministro informou que “é parte das obrigações do parlamentar em exercício do mandato, indicar projetos que tragam melhorias para estados ou municípios de sua base de atuação política. Nesse contexto, o ministro André Fufuca repudia qualquer tentativa infundada de apontar possível irregularidade, em uma ação legítima e assegurada por direito a todo parlamentar”.

A reportagem questionou ainda o ministro se ele não via conflito ético no fato de ter indicado o recurso para a prefeitura de seu pai contratar um jovem suspeito de comprar votos para ele em 2018 e obteve a seguinte resposta: “André Fufuca ressalta, ainda, que a pessoa citada nunca trabalhou como funcionário seu em nenhuma campanha política ou em qualquer outro momento. Também reforça que não é atribulação (sic) do parlamentar realizar contratações. Esta é uma responsabilidade legal do município”.

Oficialmente, Caio Rubens não aparece como prestador de serviços para a campanha eleitoral de Fufuca em 2018, mas seu nome e CPF constam na declaração de gastos da campanha de 2022 do hoje ministro com a rubrica “despesas com pessoal” e o valor de R$ 10 mil. Nas duas eleições, Fufuca foi eleito deputado federal pelo Maranhão, cargo que deixou no ano passado para assumir o Ministério dos Esportes. A reportagem encaminhou o print da prestação de contas de campanha de Fufuca em 2022, no qual aparece o nome de Caio e questionou novamente o ministério sobre o trabalho prestado por Caio à campanha de Fufuca nesta terça. Em resposta encaminhada nesta quarta-feira, (4) a pasta afirmou que:

“O registro de prestadores de serviços contratados por um comitê eleitoral é ato obrigatório da prestação de contas das campanhas aos órgãos fiscalizadores e à Justiça Eleitoral. O que não pode ser traduzido em uma relação direta entre o candidato e o fornecedor do serviço. O ministro do Esporte, André Fufuca, reitera que a pessoa citada nunca trabalhou como seu funcionário”.

A reportagem enviou e-mail para a prefeitura de Alto Alegre do Pindaré nesta terça-feira (2) e tentou contato telefônico com o controlador-geral do município, que não atendeu às ligações e nem retornou as mensagens até o fechamento deste texto. O espaço está aberto para a manifestação do município e do prefeito.

A reportagem também enviou e-mail para a Projeplan e para Caio Vieira, mas não obteve retorno até o momento. O advogado de Caio Vieira, Willey Azevedo, informou que seu cliente não iria comentar o caso.

A reportagem questionou a Codevasf sobre a velocidade da aprovação do convênio com Alto Alegre do Pindaré mesmo sem a apresentação de documentos necessários. Em resposta, a empresa informou por meio de nota que todas as condicionantes exigidas pelo governo federal para a formalização do convênio com o município foram cumpridas.

A companhia ainda afirmou que “os detalhes técnicos da execução do convênio são objeto de análise em etapa posterior à de formalização do instrumento. É de responsabilidade da municipalidade apresentar o projeto básico que caracterize integralmente a obra a ser realizada, que é submetida a rigorosa análise técnica da Codevasf”. Na nota, a Codevasf ainda disse que em dezembro de 2020, somente a 8ª Superintendência Regional da Codevasf, que atende o Maranhão, fechou 14 convênios, “o que demonstra eficiência habitual na aplicação dos recursos destinados a iniciativas de desenvolvimento regional”.

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