A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra três policiais rodoviários federais pela morte da menina Heloísa, de 3 anos, foi aceita pela Justiça Federal no Rio de Janeiro.
A menina morreu em setembro, ao ser atingida na nuca por disparos feitos pelos agentes federais, quando estava no carro da família com outras quatro pessoas. O grupo voltava de um passeio na região do Arco Metropolitano, em Seropédica, no Rio de Janeiro. A denúncia foi feita pelo Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial do MPF.
No documento enviado à Justiça, os policiais são acusados de homicídio consumado e quatro tentativas de homicídio, além do crime de fraude processual. Ao receber a denúncia, a Justiça manteve as medidas cautelares já impostas aos réus, por exemplo o uso de tornozeleira eletrônica e a proibição de se aproximarem das vítimas.
Agora, o processo segue com a citação dos agentes para apresentarem resposta à acusação. O MPF, que recorreu ao Tribunal Regional Federal da 2ª (TRF2) pedindo a prisão preventiva dos policiais, espera que ainda no primeiro semestre de 2024 eles sejam levados à Júri Popular Federal.
Coautoria de agentes
O Ministério Público também defende que os três agentes devem responder pela prática dos crimes, conforme prevê o Código Penal. Pela lei, detalha o órgão, não é necessário que todos tenham praticado o ato, basta ficar comprovada a “confluência de vontades”.
Para MPF, não há dúvidas de que os policiais decidiram, “em comunhão de desígnios e por vontade livre e desimpedida”, se aproximar do veículo e atirar contra ele. A petição destaca que, conforme apurado na investigação, em nenhum momento houve discordância entre os acusados quanto a essa decisão.
A denúncia também rebate o argumento dos réus de que a perseguição teria sido motivada pela informação de que se tratava de veículo roubado. Nos registros do Departamento Nacional de Trânsito (Detran), o MPF ressalta que não havia nenhuma restrição ao veículo. Além disso, o carro foi comprado pelo valor de mercado e tanto o pai de Heloísa quanto o vendedor afirmaram desconhecer o registro de roubo, de agosto de 2022.
O crime
As armas usadas pelos policiais na ação foram fuzis considerados de grosso calibre e longo alcance. Na denúncia, o procurador da República Eduardo Benones lembra que esse tipo de armamento foi projetado para uso militar, por ter maior velocidade, menor recuo e, consequentemente, por aumentar a letalidade.
“Apesar do longo alcance do fuzil utilizado e de seu alto poder de fogo, o teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas prova que a distância entre os atiradores na viatura policial e as vítimas não era mais do que vinte metros no momento dos disparos“, afirma. Segundo o procurador, mesmo portando pistolas no momento da perseguição, os agentes optaram por usar os fuzis.
Em outro trecho do documento, a denúncia destaca o fato de não ter havido nenhuma abordagem ao motorista do veículo pelos policiais antes dos disparos. Testemunhas ouvidas durante a investigação afirmaram que, entre o momento em que o veículo passou pela viatura policial e os tiros, não houve nem sequer um esboço de comunicação.
Para o MPF, o fato evidencia que os agentes da PRF quiseram a morte dos ocupantes do veículo ou, no mínimo, assumiram o risco de que isso acontecesse. “Na realidade, não é minimamente crível que, ao cravejar com tiros de calibre 5.56 um veículo tripulado e com carroceria comum, a poucos metros de distância, houvesse outra intenção senão a de matar”, pontua o documento.
A procuradoria também ressalta o fato de não ter havido nenhum disparo contra os pneus do carro. A apuração indicou que nem foi preciso trocá-los para que o veículo — conduzido por um dos policiais e com o pai de Heloísa como passageiro — pudesse chegar até o hospital onde a menina foi atendida.
“Em outras palavras, não houve a intenção de deter ou advertir”, resume a denúncia. Heloísa ficou internada por 9 dias no Hospital Adão Pereira Nunes, mas acabou não sobrevivendo, em razão dos ferimentos.
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