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Quando o bolsonarismo surgiu, com um inédito repertório de baixaria, mentiras e truculência, a imprensa insistiu em tratar seus personagens como espécimes banais.
Desde a homenagem de Jair Bolsonaro ao facínora Brilhante Ustra, na sessão da Câmara que decidiu o impeachment de Dilma Rousseff, até a campanha do ex-presidente pelo golpe de Estado, era claro que a política brasileira caminhava para o inferno. Apesar de todos os sinais, um misto de antipetismo e uma noção deturpada de imparcialidade jornalística fez com que os veículos de comunicação lidassem com inimigos da democracia e seus apoiadores como figuras republicanas.
Essa escalada permitiu que o abjeto Bolsonaro fosse normalizado pelo eleitor a ponto de ser eleito à Presidência.
Mesmo com a coleção de crimes contra a democracia e com a série de atentados à vida da população, como ocorreu na pandemia, os bolsonaristas continuaram a ser convidados por jornalistas para participar do debate público, como se tivessem algo a contribuir para o bem-estar dos brasileiros.
Isso foi um dos fatores mais importantes para que o país, mesmo se salvando da reeleição de Bolsonaro, elegesse o pior Congresso de todos os tempos. Na Câmara, em especial, a aberração é a regra. Ali, os políticos que pensam realmente no interesse público são exceções.
O grupo mais barulhento somente está comprometido com a barbárie e a lacração, sob o olhar indulgente do presidente da Casa, Arthur Lira.
Diante do sucesso da empreitada bolsonarista, outros aventureiros políticos se sentiram incentivados. Foram à luta.
E aí está Pablo Marçal, o Bolsonaro 2.0.
Mesmo após a experiência distópica dos últimos anos, a imprensa repete o erro e trata Marçal, candidato à Prefeitura de São Paulo, como se ele fosse digno de respeito.
Boa parte do jornalismo brasileiro finge ignorar que o coach foi condenado por dar golpes financeiros em velhinhos, é um charlatão que promete fazer cadeirantes andarem, está cercado de gente envolvida com o PCC, é um ser execrável capaz de tripudiar sobre o suicídio do pai de uma adversária política, um canalha que inventa em rede nacional que o concorrente é cheirador de cocaína. E por aí vai.
Além disso, não respeita regras democráticas das eleições — todos sabem que paga pelo impulsionamento de postagens nas redes — e nem dos debates.
Com tudo isso, Marçal segue tendo espaço nos noticiários. Ainda recebe convite para sabatinas e é chamado para debates.
Já passou da hora de tratar o coach como se faz com os motoristas de ônibus: noticiemos sobre ele somente o indispensável. E sempre com tom crítico — algo que faltou no caso de Bolsonaro.
Participação em debates, nem pensar: quem joga fora das regras sempre leva vantagem.
Se a empreitada de autopromoção de Marçal continuar dando certo, novos aventureiros poderão surgir.
E, como o Brasil está cansado de saber, nada é tão ruim que não possa piorar.
A continuar como está, a imprensa estará colaborando decisivamente para o surgimento do Marçal 2.0.
Ainda há tempo de evitar.
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