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Por Carolina Bataier

Há dois meses, nove famílias da comunidade Vista Alegre do Cururu, no município de Tefé (AM), na região da bacia do rio Solimões, estão vivendo em três moradias flutuantes no rio Japurá. “Não ficou ninguém na comunidade, não tem como sobreviver. Não tem água potável, não tem água para lavar roupa, não tem água para fazer comida”, conta José Ribamar Lima, morador da comunidade há 8 anos.

Cerca de 1.554 comunidades estão isoladas somente na região da calha do médio Solimões, trecho da bacia do Rio Solimões onde fica Tefé, segundo a Defesa Civil do Estado do Amazonas. A região abrange também os municípios de Uarini, Alvarães, Tefé, Coari, Jutaí e Fonte Boa. Em todo o estado, 115.378 famílias foram afetadas pela estiagem até o dia 16 de setembro.

O governo do Amazonas distribuiu, até o momento, 31 purificadores de água, sendo dez deles direcionados para a calha do alto Solimões, onde escassez de água chegou mais cedo. Também foram enviadas 100 caixas d’água para melhorar o acesso à água potável.

Em Tefé, as embarcações grandes não conseguem chegar até a área de descarga. “Os barcos de grande e médio porte não conseguem mais entrar, tendo que ancorar em frente a uma comunidade distante a 9 quilômetros da cidade”, informou a assessoria da imprensa da Defesa Civil do município. Embarcações menores, como lanchas e canoas, têm levado as cargas até a cidade. Como boa parte do transporte de pessoas também é feito pelos rios, as aulas no município foram suspensas.

“Esse é o primeiro ano que vejo secar dessa forma”, conta Arielly Bastos, que trabalha em um frigorífico em frente ao lago de Tefé, um dos pontos usados para o acompanhamento do nível da água. Lá, a régua de medição já indica o estado crítico. “Não conseguimos mais fazer a leitura dos rios porque a régua que usamos como base já está marcando abaixo de zero”, informa a Defesa Civil.

Na comunidade Vista Alegre do Cururu, em Tefé, o rio fica cada vez mais longe das casas (Foto: Arquivo pessoal/José Ribamar Lima)

Frequência das secas nas comunidades

As secas têm chegado cada vez mais cedo e estão cada vez mais próximas no Amazonas, conforme observaram os pesquisadores do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis) na Universidade Federal de Alagoas (Ufal). “Está começando a aparecer uma sazonalidade que a gente via só na região Centro-Oeste ou na região Nordeste”, diz Humberto Barbosa, meteorologista e pesquisador do Lapis, que estuda as bacias hidrográficas no Brasil há cinco anos. “Começaram a ter muitos picos rápidos num intervalo de tempo mais curto”, explica. Em Tabatinga, no alto Solimões, o rio começou a secar 30 dias antes do esperado.

“Nós estamos vivendo esse cenário desde 2022, onde tivemos uma grande seca dos rios. Em 2023, ultrapassou a anterior e essa de 2024 já ultrapassou a de 2023”, informa a Defesa Civil de Tefé. Antes disso, a última seca severa registrada havia sido em 2010, segundo a base de dados da Defesa Civil.

“Os mais antigos dizem que nunca existem duas secas grandes ao mesmo tempo”, diz Ribamar. Para ele, este ano a estiagem está mais severa. “Em 2020, secava na frente da comunidade, mas a gente ficava próximo, uns 300 metros”, lembra.

Com o rio distante das moradias, quem tentou permanecer na comunidade precisava caminhar na lama até a água. Dia após dia, os moradores foram abandonando Vista Alegre do Cururu, que agora está tomada pelo mato. Alguns foram para Tefé. Outros, como Ribamar, estão nos flutuantes. Ele só pretende voltar para a comunidade no mês de março de 2025, quando o rio estiver cheio. “E o pior é que onde nós moramos, a seca de Tabatinga ainda não chegou toda. Ainda vai secar 30 dias. Vai morrer muito peixe, a gente já sabe”, lamenta.

Comunidade Vista Alegre do Cururu, antes da temporada da seca (Foto: Arquivo pessoal/José Ribamar Lima)

 

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