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João Cezar de Castro Rocha

Professor Titular de Literatura Comparada (UERJ) e Cientista do Nosso Estado (FAPERJ). Autor de 14 livros; seu trabalho já foi traduzido para o espanhol, mandarim, italiano, francês, alemão e inglês.

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Nem vem que não tem: Wilson Simonal e Sarah Vaughan – II

O mundo pelo avesso se completa num lance de gênio
11/03/2025 | 06h22

A entrevista

Retorno ao encontro de dois grandes artistas: Wilson Simonal e Sarah Vaughan. A ocasião foi tornada possível graças à assinatura de um contrato de Wilson Simonal com uma empresa multinacional petrolífera, a Shell.

(Em si, esse contrato era um feito inédito no meio artístico brasileiro.)

Volto à versão mais curta do vídeo; metade dele ocupada por uma deliciosa entrevista perfeitamente coreografada. Nela, uma paródia propriamente antropofágica ocupa o centro da cena.

Vejamos.

Wilson Simonal, mestre impecável e com pouca cerimônia, naturalmente não aceitaria ser intermediado por um tradutor! Ele prefere arriscar um inglês macunaímico e, sobretudo, inverte malandramente a hierarquia usual nas relações entre, digamos, uma estrela norte-americana e um cantor brasileiro de sucesso. No palco do programa Flávio Cavalcanti, Simonal não hesitou: nem vem que não tem!

Simonal vestiu azul e a sorte da entrevista mudou. O artista brasileiro teve uma ideia genial: Sarah Vaughan limitou-se a responder “yes” ou “no”, como se fosse ela que não falasse inglês. Ademais, o jogo linguístico permitiu a Simonal comanda a ação.

— Quer dizer que você não tá na minha?

— Yes!

— Já que tá na minha, vou te convidar pra gente tomar um drinkinho juntos e uma coleção de borboleta que eu tenho em casa, aqui no Morumbi.

— No…

O mundo pelo avesso se completa num lance de gênio. Agora, Simonal fala em inglês e cabe a Sarah Vaughan se esforçar para reproduzir sons em português. A coreografia verbal já tinha dado o seu máximo e Simonal tinha mesmo colocado pra quebrar.

Mas por que não ousar um pouco além? Reiterar o completo domínio sobre a plateia, por exemplo.

— Por favor, não tumultuem! Gentlemen, I am speaking English…

Hora de dar atenção à coadjuvante:

— Miss Sarah, repeat with me: vou deixar cair.

— Vou deixar cair…

— Vamos!

Na sequência, um dueto inesquecível: Wilson Simonal e Sarah Vaughan fazem literalmente o público levitar com uma performance excepcional. Uma imagem se impõe: a grande estrela norte-americana parece embevecida com o artista brasileiro.

(Ou não? Será que deixo me levar pelo entusiasmo?)

E vejam que nem mencionei ainda a versão completa do vídeo.

Mas você já sabe: na próxima coluna concluo a série de artigos dedicada à leitura do encontro de Wilson Simonal e Sarah Vaughan.

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