O acordo entre a União Europeia e o Mercosul é um êxito comercial e um fato geopolítico da maior importância. O Mercosul faz pela primeira vez um acordo de envergadura com um dos principais blocos econômicos e o mundo fica a saber que este existe e que está ativo. Para a parte europeia este acordo significa uma nova parceria econômica, numa geografia até agora desvalorizada pelos países mais desenvolvidos. Todavia, mais do que o interesse econômico para ambos os blocos, o acordo é um tremendo e inesperado sucesso político com repercussões globais.
Primeiro ponto, o acordo surge em contracorrente. Ao fim de vinte e cinco anos de negociação, e numa época de ascensão das políticas protecionistas, o acordo comercial é um fato político com o seu quê de extraordinário. Enquanto o mundo se fecha, a Europa a e a América Latina (uma boa parte dela) abrem-se ao comércio. Só por esta razão, o acordo alcançado merece celebração. Segundo ponto, enquanto o novo presidente norte-americano fala de tarifas e de restrições às importações, a Europa e a América do Sul falam de cooperação econômica. Enquanto a ideia de “Tornar a América Grande Outra Vez” parece ser a de impor uma espécie de tributo imperial (a que chamam tarifa), a Europa e os países do Mercosul falam em vantagens mútuas na colaboração econômica. Finalmente, terceiro ponto, enquanto as medidas restritivas ao comércio atingiram 12, 7 por cento das importações nos países mais desenvolvidos (números da OCDE), a Europa e o Mercosul resolvem baixar tarifas. Estes três pontos são suficientes para fundamentar o que quero dizer: o acordo é um êxito político, para a Europa, para o Mercosul e para o mundo.
Isto dito, gostaria de acrescentar que este acordo é mais importante para a Europa, que pretende recuperar um pouco do protagonismo que perdeu ultimamente nos assuntos mundiais. Por um lado, a vantagem econômica parece-me absolutamente evidente. Nos últimos vinte anos o mercado das empresas europeias no espaço Mercosul passou de 35% para 18% (números do antigo diretor da divisão de comércio da comissão europeia). Quase metade. Este acordo visa justamente por fim a esse declínio. Por outro lado, implícito a este acordo está também a disputa geopolítica. Nas palavras de um analista do Conselho Europeu “todo o atraso suplementar no acordo reaproximará a América Latina da órbita da China — no melhor cenário.” Isso mesmo. O acordo entre os dois blocos comerciais tem uma forte dimensão estratégica.
A aprovação pela Comissão Europeia não é o fim do caminho. Falta ainda a aprovação do Conselho (que tem de ter maioria qualificada de mais de 15 países e de 65% da população) e a aprovação do Parlamento Europeu. Mas, neste momento, qualquer falhanço na aprovação subsequente do acordo seria um desastre político de consequências muito negativas para a Europa. Conheço a oposição francesa e as resistências de outros países. Mas os argumentos não me convencem. No meu ponto de vista, a aceitação ou rejeição deste acordo terá um profundo significado político para o projeto europeu — recusá-lo significa aceitar o declínio; aceitá-lo significa lutar contra ele. O acordo mostra ao mundo que o Mercosul existe; para a Europa o acordo mostra que esta quer continuar a existir no mundo.
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