Por Ayam Fonseca*
Na noite de terça-feira (23), policiais militares do 14º BPM do Distrito Federal invadiram a Casa Ilê Asé Omin Yemonjá Ogunté, em Planaltina, para efetuar a prisão de um suspeito que teria se escondido dentro do local. Testemunhas relataram que os PMs usaram violência excessiva contra o foragido, e acusaram os policiais de terem cometido racismo religioso.
O fugitivo que se escondeu dentro do terreiro é irmão do líder religioso da casa, o Bábàlorisá Uanderson, e, de acordo com relatos, o suspeito chegou ao local algemado, com o nariz e a boca sangrando, logo após fugir da abordagem dos agentes.
A coordenadora da Comissão de Direitos Humanos, Dani Sanchez, acompanhou o caso e contou que após ser detido por suspeita de tráfico de drogas, o irmão do pai de santo teria se aproveitado de um momento de descuido dos agentes para se esconder no terreiro.
No momento da chegada da PM, o terreiro se encontrava funcionando, realizando cerimônias religiosas. Imagens de vídeos divulgados na internet mostram os PMs batendo no portão da casa e pulando o muro do terreno.
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Racismo religioso e violência
Segundo relatos, os policiais teriam ofendido os fiéis, os chamando de “desgraça” e falando que o lugar era um “inferno”.
Outra reclamação foi a forma violenta como foi feita a abordagem. Um vídeo publicado na internet mostra um dos policiais segurando o rapaz, enquanto uma testemunha avisa que ele está sendo sufocado.
Em um desabafo nas redes sociais, o Bábàlorisá Uanderson falou sobre o acontecido.
“Eu estou em estado de choque, tive minha casa invadida”, diz o líder religioso, que continua “O policial jogou ele no chão, jorrava sangue pela boca, pelo nariz, pelos ouvidos, e com um corte imenso na cabeça! Ele caiu algemado e o policial subiu em cima dele. Eu pedi ‘Para com isso, você vai matar ele!’. De tanto eu implorar o policial soltou e saiu. Depois eles invadiram minha casa, pularam os muros, profanaram meu templo, meu corpo espiritual”.
Segundo Sanchez, a polícia alegou que os ferimentos do suspeito foram devido uma queda.
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Márcia Medrado, Iaô que está de obrigação na casa de Uanderson, fez um relato no Instagram sobre a abordagem e a intolerância sofrida por eles. “Ele [o foragido] já estava algemado, mas mesmo assim houve agressões e abusos de autoridade”, conta. “A casa estava em função, eu e outros irmãos estavamos fazendo nossas obrigações, e tivemos que nos depara com essa calamidade que foi humilhante e desrespeitosa” conclui.
Márcia ainda conta que os policiais entraram em espaços sagrados da casa. “Eles entraram nos quartos de Santos, onde se encontravam os ibás, que para nós é extremamente sagrado, é preciso toda uma ritualística para adentrar esses espaços”, diz a Iaô.
Os policiais acreditavam que os membros da casa estavam dando abrigo ao fugitivo, contudo, eles afirmaram em vídeo nas redes sociais que não estavam escondendo o foragido, e que respeitam e acreditam na justiça. A queixa do terreiro foi em relação a violência descabida que foi aplicada.
“Por mais que ele tenha cometido um crime, o terreiro não queriam que ele fosse assassinado dentro do local devido a uma abordagem policial despreparada […] Como comissão dos Direitos Humanos não buscamos uma apuração sobre a violência desproporcional que foi cometida nesse caso”, pontuou Dani Sanchez.
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Violência policial no DF
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) publicou um relatório que mostrava que a violência policial no Distrito Federal aumentou sete vezes em quarto anos.
De acordo com os dados, de 2020 a 2023, o número de denúncias de violência policial passou de 11 para 78. O número de casos quase dobrou de 2022 para 2023, quando foram registradas 40 denúncias.
O relatório aponta denúncias de todo tipo, como práticas discriminatórias, ameaças, abordagens truculentas, perseguição, prisão ilegal e até mortes. O documento aponta que dentre esses casos 3 vítimas foram fatais.
Na época, o deputado distrital Fábio Félix (PSOL), presidente da Comissão destacou que são necessárias medidas de apuração nas corregedorias, junto a ações de prevenção, como a implementação de uma formação mais humanizada dos policiais. “Para que haja uma voz ativa do Estado e não se naturalize a violência policial”, afirmou.
*Estagiário sob supervisão de Chico Alves
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