Por Leandro Melito — Brasil de Fato
A prefeita de Paris, Anne Hidalgo, e outras duas autoridades mergulharam nesta quarta-feira (17) no rio Sena a nove dias da cerimônia de abertura da Olimpíada de Paris-2024, que terá várias competições no local. Com um traje preto e os cabelos presos, Hidalgo nadou 100 metros ao lado do presidente do comitê organizador dos Jogos Olímpicos, Tony Estanguet, e o prefeito da região de Île-de-France, Marc Guillaume, em um ato simbólico mais de 100 anos após a medida da prefeitura que proibiu os mergulhos no rio em 1923.
“Me parece que está sendo dada uma importância demasiada a esse gesto. É claro que é muito midiático você ter uma prefeita e mais o presidente do Comitê dos Jogos Olímpicos indo nadar no rio. Mas isso não prova em primeiro lugar que o rio esteja assim tão limpo. Ele está melhor do que antes, há um esforço que tem sido feito há muito tempo pra melhoras as condições da água do Rio Sena”, aponta o ativista ambiental brasileiro Franklin Frederick, radicado na Suíça, que integra a coalizão francesa Stop Embouteillage (ou Pare com o engarrafamento da água, em tradução livre).
Embora o estado bacteriológico do Sena tenha melhorado e sua vazão continue em queda, ainda não está confirmado se as provas programadas para o rio poderão mesmo ser disputadas lá: triatlo (30 e 31 de julho, 5 de agosto), natação em águas abertas (8 e 9 de agosto) e o paratriatlo (1º e 2 de setembro).
As más condições provocaram vários adiamentos dos ensaios da cerimônia de abertura dos Jogos, marcada para 26 de julho com o desfile ao longo do Sena. As autoridades francesas gastaram quase US$ 1,4 bilhão (R$ 7,63 bilhões na cotação atual) para limpar o rio, proibido para mergulhos há mais de um século devido à navegação fluvial e à poluição.
Mobilização contra uso predatório da água na França
Mas nem tudo são águas tranquilas na França. No momento em que a prefeita realizou o mergulho no Sena, cerca de 10 mil manifestantes se reuniram na cidade de Poitou, no sul do país, em uma grande mobilização para denunciar o uso predatório das águas pelo agronegócio no país, assim como a conexão das empresas que promovem a destruição ambiental com a extrema direita francesa.
“Esse evento me parece de uma importância muito maior e mais significativa do que a prefeita de Paris ter ido nadar no Rio Sena. É uma manifestação gigantesca chamada principalmente pela confederação dos agricultores franceses, que vai discutir os impactos da agricultura industrial no meio ambiente e na conservação da água. Ela faz parte de uma mobilização que existe há alguns anos na França contra as megabacias, gigantescos reservatórios artificiais onde se guarda água para irrigar a produção das grandes empresas da agricultura industrializada. Além de causar um imenso dano ao solo, desperdiçam uma imensa quantidade de água”, aponta Frederick.
Prefeita: longe da manifestação
Como parte da mobilização em Poitou está sendo convocada para o sábado (20), uma grande manifestação antifascista, onde os movimentos ambientais franceses chamam a atenção para as relações entre a base econômica que apoia a extrema direita e está diretamente ligada a grandes empresas ligadas ao agronegócio e à devastação ambiental no país.
“Não vamos nos esquecer da Frente Popular de 1936. Ela nasceu nas ruas de uma manifestação antifascista. Suas principais medidas, como a introdução de férias remuneradas, foram o resultado de uma longa greve geral e ocupações de fábricas que começaram no dia seguinte à sua vitória eleitoral. Na convocatória Por um levante antifascista (Pour um soulévement antifasciste), os movimentos apontam que o anúncio feito pela Nova Frente Popular (NFP) que reúne os principais partidos de esquerda no país de uma moratória sobre megabacias e autoestradas em seu programa para os primeiros 15 dias de um possível governo de esquerda “é fruto do equilíbrio de poder que nossas lutas conseguiram impor nos últimos três anos”, diz a convocatória.
“O terreno e o ritmo das Revoltas da Terra são os da luta, da auto-organização dos movimentos e da ação direta popular. Independentemente de o governo ser neofacista, macronista ou de esquerda, continuaremos a lutar contra a apropriação de terras pelo agronegócio e a concretização do mundo. Seja qual for o resultado, nossas lutas e nossas ações devem dar um passo à frente diante das ameaças combinadas da devastação ecológica e da fascistização. Este é um momento histórico. Não é suficiente bloquear o Reagrupamento Nacional nas urnas; temos que bloquear fisicamente seu caminho. Ele não deve chegar ao poder, nem em três semanas, nem em três anos!”, completa o texto.
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