“Eu não te criei pra isso! Por que você fez isso comigo?”
Na manhã da última quarta-feira, 7/05, o ônibus frescão fazia sua rota usual na avenida Brasil quando parou no congestionamento na altura de Irajá, próximo ao shopping Via Brasil. Aproveitando a ocasião, os jovens Dilson Pimenta Ramos da Silva Costa (18) e Marcelo Barbosa de Oliveira (19) abordaram o veículo anunciando um assalto. Enquanto um apontava uma arma para o motorista, o outro limpava os passageiros de seus celulares. Desespero, mas a ação não teve sucesso. A polícia conseguiu interromper o assalto, recuperar os bens dos passageiros e prender Dilson e Marcelo, mas este episódio teve o capítulo mais dramático depois da situação controlada.
Com os dois algemados no camburão, a mãe de um dos assaltantes apareceu na delegacia e as câmeras das emissoras que cobrem os casos de polícia puderam registrar uma mulher que era a pura imagem do desespero e de um Brasil que pede socorro. Chorando de maneira muito intensa, ela pediu desculpas seguidas aos policiais e à imprensa no local, assumindo uma culpa indireta e — dobrando o corpo como quem sente uma dor impossível de controlar — ela apenas perguntava ao filho “por quê”. Porque fez o que fez com ela; se era esse o presente do Dia das Mães e em seguida a parte mais dolorida: Como foi capaz, sabendo que ela ainda buscava o corpo do outro filho, irmão do que cometeu o assalto.
Durou um minuto e meio toda esta cena, mas valeu por um discurso de horas sobre uma trama complexa. Muitos são os enredos que podemos imaginar para esta família destroçada, mas alguns parecem evidentes. A tragédia de mulheres que sozinhas (ainda que com maridos e companheiros) precisam criar filhos em comunidades tomadas pela violência; encarar a morte de perto, vê-la entrar portas adentro e se sentar no sofá da sala; a impotência diante do inevitável; a solidão; as carências materiais e emocionais, a exposição, os julgamentos.

Ana Paula e seu filho Johnatha, morto por policial militar em 2014 na favela de Manguinhos (Foto: Reprodução/Arquivo pessoal)
Tudo isso está lá, na cena que dura um piscar de olhos. Uma tristeza infinita de uma maternidade frustrada daquela mãe que afirmava que não criou o filho para aquilo. Que expectativas ela possuiria? Que sonhos teria para o filho que cometeu o assalto e para o morto, desaparecido sem enterro…? Os pedidos de desculpas escancarando um sentimento de responsabilidade tremenda pelos erros de outras pessoas, ainda que seus filhos. O luto duplicado.
Nada mais romantizado na história da humanidade do que a maternidade, essa função à qual colaram um quê de divindade, criando com isso um tsunami de questões para quem é profundamente humano, mas aquele um minuto e meio de sofrimento não cabem nos anúncios melosos convidando filhos a comprar perfumes, bolsas, sapatos, roupas, flores; a dar beijos, abraços, diplomas, netos.

Bruna, mãe de Marcus Vinícius, com a camisa que o filho usava quando foi morto. (Foto: Rafael Henrique Brito/Rio de Paz)
Àquela mãe sem nome na tela se juntam muitas outras que passaram a enxergar na maternidade a morte em vida e que daquele dito popular (“ser mãe é padecer no paraíso”) ficam apenas com o verbo que machuca.
Este é um texto reflexivo sobre maternidade em um momento duro de país e de mundo, às vésperas de mais um Dia das Mães. Uma data comercial, mas culturalmente cultivada como um momento para pensar nessas mulheres que fazem crescer pessoas. No nosso caso, em um estado submersos no caos da falta de segurança pública, educação, saúde, habitação. Em uma sociedade acostumada com a indignidade.
Enquanto isso, vereadores da Cidade do Rio de Janeiro, parlamentares pagos pela população, aprovam projeto para criar o “Dia da Cegonha Reborn“. Aqueles bonecos de borracha super-realistas que imitam recém-nascidos, bebês.
Ser mãe é só padecer desde que o filho seja pobre e de carne e osso.
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