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Alexandre Ramagem, então diretor da Abin, já em julho de 2021, trabalhava para lançar suspeitas sobre as urnas eletrônicas. Em arquivo intitulado ‘‘Presidente TSE informa.docx’’, datado de 10 de julho de 2021, Ramagem que apresentava uma série de argumentos contrários às urnas eletrônicas, voltados a subsidiar as falas públicas de Bolsonaro.
O arquivo teve sua versão final em 27 de julho de 2021, dois dias antes de live de Jair Bolsonaro sobre urnas eletrônicas. No documento, Ramagem afirma: “Por tudo que tenho pesquisado, mantenho total certeza de que houve fraude nas eleições de 2018, com vitória do Sr. no primeiro turno. Todavia, ocorrida na alteração de votos”.
“(…) Entendo que argumento de anulação de votos não seja uma boa linha de ataque às urnas. Na realidade, a urna já se encontra em total descrédito perante a população. Deve-se enaltecer essa questão já consolidada subjetivamente.”
Em seguida, Ramagem propõe uma estratégia ao então presidente: “(…) A prova da vulnerabilidade já foi feita em 2018, antes das eleições. Resta somente trazê-la novamente e constantemente. A exposição do advogado dos peritos e técnicos já espanca qualquer credibilidade da urna. Deve-se dar continuidade àqueles argumentos, com devida e constante publicidade.”
“Claramente, os três ministros do STF estão contra: a segurança do pleito eleitoral; — a evolução das urnas eletrônicas; — o estabelecimento de integridade e transparência nos resultados das urnas. Estes os pontos que acredito devem ser permanentemente difundidos. Na parte técnica, a urna já está sem credibilidade, assim como o STF. ”

O ex-presidente Jair Bolsonaro e Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin (Foto: Carolina Antunes/PR)
Ramagem defendeu interferência na PF
Como Ramagem documentava as orientações que repassava a Bolsonaro, isso “permitiu a identificação de outras ações que precederam e preparam o cenário para a deflagração do plano de permanência no poder à revelia da ordem constitucional”.
Outro documento, criado em 4 de março de 2020, nomeado como ‘‘Bom dia Presidente.docx’, com versão final mais de um ano depois, em 11 de março 2021, registra a criação de grupo técnico para desacreditar as urnas eletrônicas.
No depoimento à PF, Ramagem admitiu que “costumava escrever textos de fontes abertas para comunicação de fatos de possível interesse do então presidente da República”, mas que isso não implicava necessariamente que Bolsonaro tenha tido conhecimento desses textos.
A PF, no entanto, afirma que os arquivos foram compartilhados com Bolsonaro. Para os investigadores, há coincidência de conteúdo entre o arquivo de texto “Bom dia Presidente.docx” e mensagens encontrada no celular de Ramagem com interlocutor nomeado com as iniciais de Jair Bolsonaro.
Outras convergências aparecem na nota ‘‘PR Presidente’’, cuja data de criação é 05 de maio de 2020 e versão final e 21 de março de 2023. Na nota, Ramagem aconselha Bolsonaro interferir na administração da Polícia Federal, de forma a fim de restringir a atuação dos delegados da PF em inquéritos com tramitação no Supremo Tribunal Federal.
Além dessa recomendação, há novos ataques às urnas eletrônicas e menções favoráveis à intervenção das Forças Armadas. Ramagem também sugere que Bolsonaro use a Advocacia-Geral da União (AGU) para emitir atos que tornassem devido o descumprimento, pela Polícia Federal, de ordens judiciais que desagradassem o grupo.
” (…) Este é o inquérito derradeiro, a complementar os demais, preparando fundamento para diversas medidas judiciais para quando quiserem deflagrar (afastamentos, inelegibilidade, buscas e prisões). Não conseguem imputar crimes (como até expressamente declarado nos autos), mas forçam a continuidade para investigar e inventam condutas com aspectos ilícitos.
“Corregedoria da PF, DG/PF, MJ e PGR podem arguir ilegalidade nas: instauração dos inquéritos, violação do sistema acusatório e escolha de delegados pelo STF sem distribuição. Corregedoria da PF, DG/PF e MJ podem inclusive pedir parecer da AGU (…) Este controle dentro dos autos é da PGR e do STF. Em todos os casos, um parecer técnico-jurídico darão (sic) suporte para apontar violações constitucionais e legais.”
“(…) As unidades da PF responsáveis pela execução de mandados não estão diretamente ligadas às determinações dos inquéritos. Necessitam apenas de respaldo legal (pareceres) e comando hierárquico para cumprir ou não as medidas do STF manifestamente contrárias à lei.”
As orientações encontradas nos textos de Ramagem são idênticas à anotação da agenda do general Augusto Heleno sobre o mesmo tema, ou seja, o plano de interferir na PF para descumprir decisões judiciais do Supremo sensíveis ao grupo.
Com a mesma argumentação da nora do ex-diretor da Abin, Heleno sugeria que Jair Bolsonaro utilizasse a Advocacia-Geral da União (AGU) para que emitisse pareceres que secundassem a desobediência a decisões judiciais, pretextando manifesta ilegalidade.
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