Por Mateus Coutinho — Brasil de Fato
Responsável por uma réplica do veículo utilizado pelas tropas da Alemanha nazista que marchou durante o desfile de 7 de setembro em Curitiba no ano passado, o policial Laércio Turra foi agraciado em 2020 com uma Medalha Tributo à Força Expedicionária Brasileira (FEB), concedida pelo comandante do Exército na época, o general Edson Pujol. A FEB é o agrupamento militar do país que lutou na Europa na Segunda Guerra Mundial.
Questionado sobre a medalha, destinada a homenagear pessoas ou instituições que tenham atuado em prol da preservação e difusão da memória histórica da FEB, o Exército brasileiro informou que a concessão da medalha atendeu aos requisitos previstos na época. Questionado se iria rever a concessão da honraria após o episódio revelado pelo Brasil de Fato, o Exército informou que “aguarda a solução da apuração da denúncia para estudar as ações subsequentes”.
Dentre os critérios para a concessão da medalha, segundo a portaria do Exército que regulamentou a homenagem naquele ano, estão “possuir idoneidade moral, conduta pessoal ilibada e elevado conceito na classe e na comunidade a que pertencer” e “haver praticado ação destacada ou serviço relevante para a preservação e difusão de patrimônio histórico e artístico-cultural de interesse do Exército, relacionados à FEB”.
As regras do prêmio ainda deixam claro que a premiação é concedida pelo Comandante do Exército e que os agraciados podem perder o direito ao uso da medalha caso “tenham praticado atos pessoais que invalidem as razões da concessão” ou mesmo sejam condenados “por crime contra a integridade e a soberania nacional ou atentado contra o erário, às instituições nacionais ou à sociedade”.
A cerimônia em que Turra foi agraciado foi realizada no Salão de Honra do Comando Militar do Leste, no Palácio Duque de Caxias, Rio de Janeiro, em novembro de 2020. Como mostrou o Brasil de Fato, Turra é policial civil no Paraná e preside a Brigada Paranaense de Viaturas Militares Antigas, que se se apresenta na internet como uma entidade sem fins lucrativos destinada a preservar viaturas militares antigas e a homenagear a Força Expedicionária Brasileira.
Desfile sob investigação do MPF
Apesar de presidir uma entidade destinada a homenagear a FEB, uma investigação do Ministério Público Federal no Paraná revelou que Turra era o dono de uma réplica que, na prática, representa exatamente o regime nazista que as forças brasileiras ajudaram a combater na Europa. A investigação ainda está em andamento pela Procuradoria da República no Paraná.
Ouvido pela reportagem quando o episódio do desfile veio à tona, o policial disse que já vendeu o veículo e que ele era uma homenagem ao chamado “Caroço dos Pracinhas”, nome dado a um veículo alemão que teria sido capturado pelos americanos e cedido aos pracinhas da FEB que estavam na Itália em 1944 e que reformaram a réplica. “Nosso intuito sempre foi enaltecer os pracinhas e os aliados, sempre foi isso, nada mais que isso”, afirmou Turra.
Ele chegou ainda a enviar um texto à reportagem pelo WhatsApp sobre a história do “Caroço dos Pracinhas”. Sem citar a fonte, o texto afirma que vários jipes alemães foram capturados pelas tropas americanas na África e que um deles teria sido destinado a tropas brasileiras na Itália. O próprio texto, porém, deixa claro que os jipes que eram capturados pelas tropas aliadas eram pintados com os símbolos dos aliados, o que não foi feito na réplica que desfilou em Curitiba.
Questionado sobre isso, Turra não explicou porque foi mantido o símbolo da cruz que era característico dos veículos nazistas, segundo o Museu do Holocausto de Curitiba.
A reportagem procurou Turra nesta terça-feira, (26), e perguntou a ele sobre a medalha concedida em 2020. Ele disse que não tinha nada a declarar.
Confira abaixo a íntegra da nota do Exército sobre a medalha concedida a Laércio Turra:
“Atendendo à sua solicitação, formulada por meio de mensagem eletrônica, o Centro de Comunicação Social do Exército informa que a concessão da Medalha Tributo à FEB ao Sr Laércio Turra atendeu aos requisitos contidos nos artigos 3º e 4º da Portaria–Cmt Ex nº 163, de 13 de fevereiro de 2020, sendo anterior ao fato relatado. Informa, ainda, que a Força aguarda a solução da apuração da denúncia para estudar as ações subsequentes.”
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