O governador mineiro Romeu Zema (Novo), que segue questionando a obrigatoriedade de crianças se vacinarem contra Covid-19 — embora tenha vacinado toda sua família –, resolveu criar um inusitado momento literário em seu Instagram na manhã desta segunda-feira.
Começou “costeando o alambrado”, como diria Leonel Brizola, antes de elogiar o primeiro livro do jornalista Leandro Narloch, admirado por asseclas de Jair Bolsonaro, fãs de Olavo de Carvalho, terraplanistas, negacionistas e afins. Disse Zema:
“É bom termos acesso a outras fontes, a outras visões, para não ficarmos só com uma versão. E foi o que eu fiz, lendo aqui esse livro muito interessante do Leandro Narloch, que tem muito a acrescentar às versões que nós geralmente aprendemos na escola. É um livro bem fácil de ler, levei pouco tempo, você quase que degusta ele como uma história, uma novela, tem alguns mineiros lá, Aleijadinho, Santos Dumont, uma versão bem diferente do 31 de março de 1964 e muitas coisas. Fica aí a dica para quem se interessar em ver uma história diferente da que foi contada”.
O “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil”, lançado pela Leya em 2009, tornou-se rapidamente um bestseller num momento em que crescia a insatisfação da direita e da classe média brasileira com as políticas públicas de inclusão dos governos de centro-esquerda liderados pelo presidente Lula. O autor tenta se vender como dono de um conhecimento secreto: nada menos que uma nova versão da história do país e de seus principais personagens, produzida por uma nova geração de historiadores não influenciada pelo que ele chama de “dinossauros marxistas” que teriam deturpado os fatos em seus livros históricos.
Livro supõe que talento de Aleijadinho foi inventado
Narloch inventa uma narrativa em que pessoas escravizadas são algozes que escravizam negros e acumulam riquezas e indígenas são traficantes de produtos que desmatam a floresta, por exemplo.
Sobre Antonio Francisco Lisboa, conhecido como Aleijadinho, o jornalista o compara a um “monstro” e questiona o culto ao artista, dizendo que sua importância foi inventada pelos modernistas. Narloch fala sobre o que ele chama de “uma verdade incômoda”: a de que “nem todo mundo considerava o monstro genial”. Segundo ele, “a forma e o acabamento de muitas obras atribuídas a ele pareciam grosseiros — as figuras tinham o nariz desproporcional, maçãs do rosto salientes demais, polegar na mesma direção dos outros dedos e olhos exageradamente amendoados. As igrejas que contaram com seu esforço pareciam uma versão pobre de monumentos europeus”.
Pai da aviação não é o mineiro Santos Dumont, diz livro
Com relação a Santos Dumont, também citado por Zema como um dos mineiros sobre os quais Narloch fala em seu livro, é questionada a importância histórica daquele que é considerado o pai da aviação. Diz Narloch:
“Os dois fabricantes de bicicletas dos Estados Unidos (os irmãos Orville e Wilbur Wright) voaram antes, voaram mais e contribuíram muito mais para a indústria aeronáutica que o inventor brasileiro”.
“O negacionismo de Narloch é especialmente desafiador porque não é completamente mentiroso. É abusivo, é desonesto, produz erro e engano sem atravessar as fronteiras das verdades possíveis”, escreveu Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia.
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