Por Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay*
O filosofo Unamuno, em plena guerra civil espanhola, quando o franquista general Millan Astray, na Universidade de Salamanca, deu o grito “Viva la muerte!”, respondeu de pronto:
“ Às vezes o silêncio é melhor do que mentir.”
Logo após o seminário realizado em Lisboa, o programa Lisboa Conection promoveu interessante debate, ”Diálogo Brasil e Europa”, entre o ex-primeiro Ministro Barroso Durão e o decano do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes. Em dado momento Durão comentou que não sabia o nome do presidente da Corte Portuguesa e que, no Brasil, os ministros tinham exagerada projeção. Quis intervir, mas o tempo já estava esgotado.
Embora eu concorde que a TV Justiça não deveria existir para processos criminais, pois há uma tentativa de espetacularização do processo penal, cuja excessiva exposição leva a uma pena acessória sem previsão legal, entendo que, hoje, a super exposição dos ministros tem também outro fator a ser considerado.
Saimos de 4 anos de um governo de extrema direita que, durante todo o tempo, tensionou o Judiciário tentando acuá-lo, desmoralizá-lo. A estratégia de dar o golpe e implementar uma ditadura no Brasil passava por fechar o Supremo, prender ou matar alguns ministros da Corte. Durante este período de gestação da tentativa de golpe, os ataques aos ministros foi uma regra. E temos que lembrar que neste período tínhamos um Executivo fascista e um Congresso cooptado na sua maioria. Quem manteve a institucionalidade foi exatamente o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal.

Bolsonaro frente a frente com Alexandre de Moraes no STF (Foto: Antonio Augusto/STF)
O Poder Judiciário é um poder inerte, só age se provocado. E no caso concreto agiu para impedir o golpe e a ruptura democrática. Até defendo que após a normalização democrática, com o final destes julgamentos sobre 8 de janeiro, será importante certo recolhimento da Corte. Mas não podemos nos esquecer que a todo momento a sociedade, pelos mais diversos atores, bate às portas do Supremo. E com as pautas mais diversas. É certo que em tempo de normalidade do estado democrático de direito é recomendável uma contenção dos ministros, do Judiciário. Mas neste momento ainda é muito bom saber que o Judiciário pôs a cara à tapa.
E é incrível que um Poder tradicionalmente conservador, patrimonialista, racista, misógino foi que ousou manter a democracia. É certo que já estou com vontade de voltar a criticar, mas hoje é muito bom saber que os ministros do Supremo são, sim, reconhecidos. Para uns, este reconhecimento traz segurança e certa tranquilidade. Para outros, medo e aflição.
É bom lembrar Bertolt Brecht em seu poema “ Os medos do Regime.” : um estrangeiro voltando de uma viagem ao Terceiro Reich , ao ser perguntado quem governava lá, respondeu: “ O medo.”
“Por que temem tanto a palavra clara?”
*Advogado
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