Por Amanda Miranda — Newsletter Passando a Limpo
Dados coletados e reunidos por pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto Federal de Goiás (IFG) revelam que os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro reduziram o financiamento público federal do esporte enquanto estiveram à frente da gestão do país. A ferramenta Transparência no Esporte traz também indicadores sobre o Bolsa Atleta e sobre recursos injetados ao longo dos ciclos olímpicos, demonstrando imprevisibilidade e inconstância ao longo do tempo.
Aos 33 anos, Caio Bonfim garantiu uma medalha histórica para o Brasil em uma das provas mais tradicionais das Olimpíadas: a marcha atlética. O brasiliense chegou em segundo lugar e contou, comovido, que cresceu com Joaquim Cruz, a quem atribuiu a conquista do Bolsa Atleta. Caio é um dos beneficiários do programa criado há 20 anos, ainda na primeira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva e que contabiliza mais de 9 mil atletas contemplados, 359 deles na Bolsa Pódio, a mais alta do Programa.
O apresentador global Marcos Mion viralizou, no início da semana, um vídeo no qual falava sobre a remuneração dos esportistas, atribuindo ao governo um eventual desempenho negativo nas competições. Esqueceu de mencionar, no entanto, que no governo Jair Bolsonaro o Ministério do Esporte foi extinto e se transformou em secretaria especial.
O projeto Transparência no Esporte (parceria da UnB e IFG), sintetizou o volume de investimentos no programa desde 2005. Sob Michel Temer e Jair Bolsonaro os gráficos indicam uma queda expressiva nos valores pagos aos esportistas e também nos números globais relacionados ao financiamento público federal.
Em 2014, ano em que houve ápice de pagamentos do Bolsa Atleta, foram mais de R$ 247 milhões. Em 2016, já sob Temer, esse valor foi reduzido em dez vezes, considerando a correção pelo IGP-DI. Voltou a crescer em 2019, com cerca de R$ 108 milhões, mas passou por novas quedas ao longo do governo Bolsonaro. Teve um leve crescimento na ordem de R$ 84 milhões no primeiro ano de Lula 3. No primeiro ano de pandemia, o valor só foi maior do que nos três anos de mandato de Temer.
Saída de Dilma e posse de Temer levou à descontinuidade
Para o pesquisador Fernando Henrique Silva Carneiro, professor do IFG e coordenador do portal Transparência no Esporte, este foi um momento representativo quando se fala em investimentos federais nos atletas brasileiros. Ele avalia que o processo de golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff, que levou Temer à presidência e fez com que Bolsonaro fosse eleito, resultou na descontinuidade e desestruturação das políticas esportivas no país.
“Expressão disso foi deixar de existir o Ministério do Esporte, mas também a diminuição do financiamento das políticas esportivas. Nos governos Temer e Bolsonaro houve paralisia das política públicas nessa área, enquanto setores privados se fortaleceram. O que aconteceu no esporte é expressão do que se deu em outras políticas públicas, reflexo da agenda ultraneoliberal destes governos”, avalia.
O professor também explica que, ao longo do tempo, o esporte de alto rendimento tem sido a dimensão priorizada no financiamento público federal. “O pico de recursos federais para o esporte de alto rendimento se deu no ciclo prévio aos Jogos Rio 2016. Desde então os recursos não alcançaram o mesmo patamar”, conta.
Em 2015, por exemplo, ano anterior à competição realizada no Brasil, o investimento total em esporte por parte do governo foi de R$ 2,25 bilhões, superior ao do primeiro ano de mandato de Bolsonaro, em 2019, com R$ 1,74 bilhões, antes da competição de Tóquio, adiada na sequência por conta da pandemia. Se corrigidos, os valores revelam uma diferença ainda maior, da ordem de mais de R$ 2 bilhões.
Com relação exclusivamente ao financiamento público federal do esporte de alto rendimento nos diferentes ciclos olímpicos e paralímpicos, os dados do Transparência no Esporte também revelam uma oscilação no volume de investimentos, com o recorde fixado no ciclo Rio-2016, entre os anos de 2013 e 2016. Na ocasião, foram destinados R$ 7.765,65 a essa finalidade, reduzido para R$ 6.528,49 em Tóquio e para R$ 3.067,75 em Paris, ciclo que começou em 2022, último ano de Bolsonaro no poder.
“Pela literatura científica há diferentes pilares de políticas esportivas que influenciam o sucesso internacional, sendo o financiamento do esporte um pilar fundamental para que um país tenha um bom resultado”, comenta Fernando.
De acordo com o professor, é fundamental que haja previsibilidade e constância no financiamento do esporte de alto rendimento. “Isso não tem acontecido, pois o setor acaba tendo uma variação muito grande dos recursos públicos disponíveis. Grande parte dos recursos que são para o esporte de alto rendimento são geridos por entidades de administração esportiva, sendo fundamental que estas sejam mais transparentes e lidem com recursos públicos a partir de compromisso social”, assinala.
O professor destaca ainda que é importante que haja continuidade e ampliação de políticas públicas como o Programa Bolsa Atleta, por darem condições materiais para que os atletas possam focar em seus treinamentos. Em julho, o governo anunciou o reajuste de 10,86% nos benefícios pagos em todas as categorias. Estes valores não eram corrigidos há 14 anos.
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