Por Gustavo Cabral *
O mpox, anteriormente denominado “varíola dos macacos” ou “monkeypox”, é uma infecção viral zoonótica que pode ser transmitida entre animais e seres humanos.
Desde o surto global de mpox de 2022, a doença tem sido uma preocupação crescente para a saúde pública mundial. Em julho de 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o surto de mpox emergência de saúde pública de interesse internacional, reconhecendo a rápida disseminação do vírus, que havia se espalhado para além das áreas endêmicas tradicionais e atingido diversos países por meio de contatos sexuais.
A declaração foi um alerta para a necessidade urgente de uma resposta global coordenada para conter o surto, melhorar a vigilância e mobilizar recursos internacionais. Embora o surto global tenha mostrado sinais de desaceleração e a emergência de saúde pública de interesse internacional tenha sido encerrada em maio de 2023, com uma queda sustentada nos casos globais, a mpox continuou a circular, especialmente em regiões onde já era endêmica, como a República Democrática do Congo (RDC).
Em agosto de 2024, a OMS renovou seu alerta ao declarar novamente a mpox como emergência de saúde pública de interesse internacional, devido ao aumento dos casos e mortes relatados. Mas é importante ressaltar que a OMS e diversas organizações de saúde continuam monitorando a situação de perto. Por isso, é tão importante o compartilhamento de informações corretas para a sociedade participar da luta contra esta e outras doenças infecciosas.
A nova variante do mpox, conhecida como variante X, tem gerado preocupações significativas devido às suas características distintas que complicam o controle da doença. Identificada recentemente, a variante X apresenta uma taxa de transmissão ligeiramente superior à das variantes anteriores, o que tem contribuído para uma disseminação mais rápida e ampla do vírus em diversas regiões.
Além disso, esta nova cepa tem demonstrado uma variação notável nos sintomas, o que inclui manifestações clínicas atípicas e possivelmente mais graves, aumentando o desafio para o diagnóstico e tratamento. De forma mais detalhada, a manifestação clínica da mpox, tradicionalmente caracterizada por erupções cutâneas, febre e mal-estar geral, tem mostrado variações significativas com o surgimento da nova variante X.
Enquanto as cepas anteriores frequentemente resultavam em lesões concentradas no rosto, nas palmas das mãos e nas solas dos pés, a variante X tem sido associada a uma gama mais ampla de manifestações, incluindo erupções cutâneas atípicas e sintomas sistêmicos mais severos, o que pode complicar o diagnóstico e tratamento.
Quanto à transmissão da mpox, ela continua a ocorrer principalmente por contato direto com lesões infectadas ou fluidos corporais de pessoas contaminadas, mas a variante X tem demonstrado uma capacidade de transmissão ligeiramente mais alta, possivelmente exacerbada por novos padrões de interação social e contato físico.
Essa maior taxa de transmissão e a diversidade de manifestações clínicas tornam essencial a atualização contínua dos protocolos de vigilância e a implementação de medidas de prevenção mais abrangentes para conter a disseminação da doença. Apesar dos dados globais indicarem um número considerável de casos e mortes associadas à mpox, a variante X intensifica essas preocupações ao potencialmente alterar o perfil de gravidade da doença.
A combinação de uma taxa de transmissão mais alta com uma apresentação clínica variável exige uma vigilância reforçada e uma adaptação das estratégias de saúde pública para lidar com as novas exigências impostas por essa cepa emergente, como tem acontecido respostas nacional e internacionalmente, por exemplo com a busca de vacinação e tratamento.
A vacinação contra mpox já está disponível, mas a cobertura vacinal global e nacional ainda é insuficiente para evitar surtos significativos e controlar a propagação da doença. Embora a vacina ofereça proteção demonstrada contra as variantes conhecidas do vírus, incluindo a nova variante X, a eficácia total contra essa cepa emergente ainda está sendo cuidadosamente avaliada.
Estudos iniciais sugerem que a vacina pode proporcionar uma resposta imunológica adequada, mas a necessidade de uma eficácia robusta é crítica, considerando as novas características e o comportamento alterado do vírus. No que diz respeito ao tratamento da mpox, os protocolos estão em contínua atualização para lidar com as novas manifestações clínicas emergentes das variantes recentes do vírus.
Atualmente, conforme relatado pelo Ministério da Saúde, a abordagem terapêutica para mpox continua a se basear principalmente em medidas de suporte clínico. Estas intervenções visam não apenas o alívio dos sintomas, mas também a prevenção e manejo de complicações e a minimização de possíveis sequelas.
A adaptação dos tratamentos é essencial para responder eficazmente às características evolutivas da doença, assegurando que os pacientes recebam cuidados adequados e oportunos para melhorar os desfechos clínicos.
Inserido nesse contexto, em uma decisão crucial para o enfrentamento da mpox no Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou, na quinta-feira passada (22/08/2024), uma resolução que autoriza a importação de vacinas e medicamentos contra a doença, mesmo sem o registro formal da agência. Esta medida é de caráter provisório e excepcional, refletindo a urgência e a necessidade de resposta rápida frente à crescente ameaça da Mpox.
A nova norma permite que o Ministério da Saúde solicite à Anvisa a dispensa de registro para a aquisição de produtos que já tenham recebido aprovação de outras autoridades reguladoras internacionais, conforme listadas na resolução.
Esses órgãos incluem a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Agência Europeia de Medicamentos (EMA), a Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA), a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde do Reino Unido (MHRA), a Agência de Produtos Farmacêuticos e Equipamentos Médicos do Japão (PMDA) e a Agência Reguladora do Canadá (Health Canada).
Essa flexibilização tem como objetivo acelerar o acesso a vacinas e tratamentos comprovadamente eficazes, mesmo que ainda não tenham passado pelo processo completo de registro no Brasil. A medida visa enfrentar a disseminação do vírus de forma mais ágil e eficiente, especialmente considerando a pressão crescente sobre os sistemas de saúde e a necessidade urgente de proteger a população.
A decisão é uma resposta estratégica às características emergentes da nova variante do mpox, que exige uma abordagem de saúde pública adaptativa e rápida. A Anvisa, ao permitir a importação de produtos aprovados por entidades internacionais respeitáveis, busca garantir que o Brasil tenha acesso a intervenções terapêuticas e preventivas de qualidade e cientificamente validadas, promovendo assim uma resposta mais robusta e bem-informada contra o surto de mpox.
Além das ações dos órgãos administrativos de saúde, a eficácia das medidas de controle da mpox depende fortemente do engajamento social.
A participação ativa da comunidade é crucial para o sucesso das estratégias de prevenção e controle. Exemplos de envolvimento social incluem campanhas de conscientização lideradas por organizações não governamentais e grupos comunitários, que ajudam a disseminar informações sobre sintomas, prevenção e a importância da vacinação.
Além disso, iniciativas de mobilização comunitária, como eventos de vacinação em massa e programas educativos, podem fortalecer a colaboração entre cidadãos e autoridades sanitárias.
O sucesso de medidas de controle, como a vigilância e a resposta rápida a surtos, é consideravelmente ampliado quando a população participa ativamente e adota comportamentos recomendados. Portanto, a integração dos esforços comunitários com as ações do poder público potencializa a eficácia das intervenções, garantindo uma resposta mais robusta e coordenada frente à mpox.
*Imunologista PhD e coordenador de pesquisa no Departamento de Infectologia e Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da USP, para o desenvolvimento tecnológico de vacinas aplicadas contra Covid-19, Chikungunya, Zika e Dengue vírus.
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