Por Catarina Duarte — Ponte Jornalismo
Interditada em 2021 por risco de desabamento (“vai morrer todo mundo soterrado”, disse um das presas ouvidas pela Ponte na época), o Centro de Progressão Penitenciária (CPP) Butantã, na zona oeste da capital paulista, passou por uma reforma que durou quase três anos, até ser finalmente reinaugurada em junho deste ano, como presídio masculino.
Mas a reforma não corrigiu os problemas estruturais da unidade prisional, que ganhou, por causa da fragilidade da construção, o apelido de “cadeia de papel”, segundo o policial penal Fábio Jabá, presidente do Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo (Sifuspesp).
Após duas fugas, na semana passada, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), do governo Tarcísio Freitas (Republicanos), passou a transferir presos do CPP Butantã de volta para o CPP de Franco da Rocha, na Grande São Paulo. A unidade é justamente de onde parte dos detentos haviam sido retirados devido às más condições do prédio, que em agosto do ano passado estava “caindo aos pedaços”, conforme constatou uma visita da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
Cadeia de papel
O prédio onde funciona o CPP Butantã não foi construído para ser uma prisão, diz Fábio Jabá, presidente do Sifuspesp. “Cadeia tem parede grossa. Para o preso conseguir furar tem que bater muito. A maioria, paredes de concreto. Ali [no Butantã] é uma parede de casa comum”, afirma.
Em 2021, a Ponte revelou denúncias sobre as condições precárias do CPP. Egressas e detentas relataram em uma carta que temiam a queda do prédio da unidade. Péssimas condições sanitárias, falta de água e de assistência médica também integravam a denúncia. As detentas contaram lidar com a presença constante de percevejos, ratos e pombos em várias partes da unidade, inclusive a cozinha, e que temiam que o prédio pudesse desabar.
Após as denúncias, uma vistoria da Defensoria Pública constatou buracos e rachaduras no chão e nas paredes, que corriam risco de ceder. Depois disso, em outubro de 2021, o governo interditou o espaço e deu início a uma reforma.
O contrato para execução da obra foi assinado em dezembro daquele ano pelo valor inicial de R$ 9.573.458,80. O prazo de execução era de 15 meses (dando 1 ano e quatro meses). Até junho deste ano, o contrato seguia recebendo prorrogações no prazo de vigência e aditivos financeiros que inflaram o custo a cerca de R$ 11 milhões.
Mesmo após tantos gastos, os problemas do CPP Butantã pouco mudaram, segundo Fábio Jabá. “Só maquiaram. Porque o problema estrutural continua”, diz o sindicalista.
Transferências
Desde 26 de junho, a Secretaria de Administração Penitenciária começou a enviar presos para a recém reinaugurada CPP do Butantã. As fugas foram registradas logo depois, nos dias 13 e 15 de julho. Segundo a SAP, em nota enviada à Ponte, sete fugiram. Até esta segunda-feira (22/7), três havim sido recapturados.
Na quinta-feira (18/7), houve um motim na unidade. Segundo o Sifuspesp, todo o contingente do Grupo de Intervenção Rápida (GIR) da capital foi mobilizado para a unidade. Ainda conforme a instituição, a ação dos presos teria ocorrido porque, após as fugas, os presos do Butantã temiam ser transferidos para o CPP de Franco da Rocha.
A coordenadora do Núcleo Especializado de Situação Carcerária (NESC) da Defensoria Pública de São Paulo, Camila Tourinho, conta que a unidade era um prédio antigo, que abrigou o Manicômio Judiciário de Franco da Rocha na década de 30.
Em visita feita em agosto de 2023, a Defensoria encontrou uma situação precária e perigosa. Celas sem ventilação ou iluminação adequada estavam superlotadas. Infiltrações levavam água misturada a chorume até as celas. Vazamentos comprometem a higiene do local. “O prédio realmente estava caindo aos pedaços”, afirma a defensora.
A tratativa feita à época pela Defensoria era para retirar os presos de Franco da Rocha e levar à unidade do Butantã, que, em tese, deveria estar em condições melhores por ter acabado de passar por uma reforma.
Motim no presídio Franco da Rocha
O motim no Butantã não foi único a elevar a temperatura no sistema penal paulista nos ultimos dias. No sábado (20/7), detentos da Penitenciária I de Franco da Rocha fizeram um motim.
Imagens feitas pela TV Globo registraram os presos ateando fogo em colchões e lençóis do presídio. A emissora também registrou a ação que reprimiu o motim.
Os presos foram colocados nus no pátio da unidade, onde foram enfileirados e sentados de costas. A rebelião começou por volta das 10h e acabou controlada até as 14h.
O presidente do Sifuspesp não vê relação direta entre a situação do Butantã e a rebelião em Franco da Rocha. Mas lembra que a falta de agentes prisionais coloca ainda mais pressão no sistema prisional.
Segundo o Sifuspesp, o déficit em junho ficou em 33,3% agentes de segurança penitenciária e 27% agentes de escolta e vigilância penitenciária.
O governo precisa agir rápido para evitar que 2006 se repita. É preciso recompor o efetivo de policiais penais, investir em infraestrutura e equipamentos de segurança, além de promover políticas públicas que possibilitem a reinserção social dos presos”, escreveu o sindicato em nota.
O ano de 2006 ficou marcado pela onda de rebeliões nos presídios de São Paulo. Uma das consequências disso foram os Crimes de Maio. O massacre promovido por policiais e grupos de extermínio deixou mais de 500 mortos pelo estado.
O que dizem as autoridades
A Ponte procurou a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP-SP) solicitando entrevista com um porta-voz da pasta. Também foi solicitada uma posição sobre CPP do Butantã, as transferências e sobre o motim em Franco da Rocha.
Em nota, a SAP respondeu que foram localizados três dos sete presos que fugiram do CPP do Butantã. A pasta chamou de insubordinação o que houve na quinta-feira (18/7) na unidade. Após contenção do Grupo de Intervenção Rápida (GIR), a situação foi controlada, afirmou.
A SAP confirmou que estão sendo feitas transferências de presos do CPP do Butantã. Segundo a pasta, isso ocorre para “alcançar melhor adequação de estruturas e população carcerária”.
Já sobre Franco da Rocha, a SAP afirmou que o que houve foi um motim e não rebelião, já que não houve reféns ou feridos. A suspensão das visitas, justificou, teria ocorrido por indisciplina, sem explicar do que se tratou.
Cinco presos foram encaminhados para hospitais e não correm risco de vida. Nesta segunda-feira (22/7), 161 presos da unidade foram transferidos para cumprimento de sanção disciplinar, informou a SAP.
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