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R$ 2 de cada R$ 3 em benefícios fiscais não gera retorno à sociedade, diz Unafisco

R$ 537,5 bilhões por ano deixam de ser arrecadados sem que isso tenha benefício comprovado para o país
29/07/2024 | 16h38

Por Vinicius Konchinski — Brasil de Fato

Aproximadamente R$ 2 de cada R$ 3 concedidos em isenções concedidos pelo governo federal anualmente não geram benefícios ao país. Neste ano, serão R$ 537,5 bilhões distribuídos em benefícios fiscais sem comprovação de que isso realmente gera algum benefício para a sociedade brasileira como um todo.

Os números foram calculados pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco Nacional). A entidade divulgou em junho um estudo sobre o que ela chama de privilégios tributários concedidos em 2024.

De acordo com a entidade, privilégios tributários são isenções concedidas a setores ou grupos específicos de contribuintes sem contrapartida adequada, notória ou comprovada para o desenvolvimento econômico sustentável ou redução das desigualdades. Os gastos tributários, por sua vez, são benefícios fiscais que resultam em perda de arrecadação.

Imposto sobre grandes fortunas poderiam gerar R$ 76 bilhões por ano cobrando 220 mil pessoas no Brasil (Foto: Levante Popular da Juventude)

Em 2024, o governo federal vai conceder R$ 789,6 bilhões em isenções. Desses, R$ 537,5 bilhões não têm retorno comprovado – ou seja, são privilégios tributários para a Unafisco. São 68% do total.

“Não somos contra os benefícios fiscais. Eles são necessários. Mas é preciso ter um controle sobre isso para que eles realmente gerem benefícios ao país”, disse Mauro Silva, presidente da Unafisco ao Brasil de Fato.

Benefícios de sempre

Silva lembrou que, sem um controle estrito, os gastos tributários beneficiam poucos e geralmente os que menos precisam.

Ele cita o imposto sobre grandes fortunas como exemplo. A cobrança dele está prevista na Constituição de 1988, mas isso foi regulamentado. Nas contas da Unafisco, R$ 76 bilhões por ano poderiam ser arrecadados com o tributo. A falta dele beneficia 220 mil pessoas no Brasil, todas elas milionárias – as quais, em tese, não precisam da isenção.

Na classificação da Unafisco, a isenção sobre as grandes fortunas é uma privilégio tributário. Confira a lista dos maiores:

  1. Isenção dos Lucros e Dividendos Distribuídos por Pessoa Jurídica:
    R$ 160,1 bilhões
    Justificativa: A isenção dos lucros e dividendos distribuídos por pessoa jurídica é considerada um privilégio tributário significativo, pois não há contrapartida adequada para o desenvolvimento econômico sustentável ou redução das desigualdades.
  2. Não Instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) :
    R$ 76,46 bilhões
    Justificativa: A ausência de regulamentação do IGF, previsto constitucionalmente, é vista como um privilégio que protege a camada mais rica da população, resultando em uma perda significativa de arrecadação.
  3. Benefícios da Zona Franca de Manaus:
    R$ 30,99 bilhões
    Justificativa: Os benefícios fiscais concedidos à Zona Franca de Manaus são considerados privilégios devido à falta de comprovação de contrapartidas adequadas.
  4.  Programas de Parcelamentos Especiais (Refis):
    R$ 29,37 bilhões
    Justificativa: Os programas de parcelamentos especiais, que incluem anistias e remissões, são considerados privilégios tributários, pois reduzem o montante do crédito tributário devido sem uma contrapartida clara.
  5. Simples Nacional:
    R$ 125,36 bilhões (parcialmente considerado privilégio)
    Justificativa: Embora o Simples Nacional seja um incentivo importante para micro e pequenas empresas, parte do benefício é considerada privilégio, especialmente para empresas com faturamento elevado que não contribuem significativamente para a geração de empregos.
  6. Desoneração da cesta básica:
    R$ 38,99 bilhões (parcialmente considerado privilégio).
    Justificativa: A desoneração da cesta básica é parcialmente considerada privilégio, pois beneficia também contribuintes com maior capacidade contributiva.
  7. Benefícios para Entidades Filantrópicas:
    R$ 19,75 bilhões
    Justificativa: Os benefícios fiscais concedidos a entidades filantrópicas são considerados privilégios devido à falta de comprovação de contrapartidas adequadas.
  8. Benefícios da Sudene e Sudam:
    R$ 23,58 bilhões (Sudene) e R$ 15,42 bilhões (Sudam)
    Justificativa: Os benefícios fiscais concedidos às regiões da Sudene e Sudam são considerados privilégios devido à falta de comprovação de contrapartidas adequadas.
  9. Benefícios para produtos químicos e farmacêuticos:
    R$ 10,80 bilhões
    Justificativa: Os benefícios fiscais concedidos ao setor de produtos químicos e farmacêuticos são considerados privilégios devido à falta de comprovação de contrapartidas adequadas.

Divergência

O cálculo da Unafisco sobre gastos tributários diverge do feito pelo governo. Isso ocorre, principalmente, porque o governo não considera a falta de cobrança sobre dividendos e sobre grandes fortunas como uma isenção.

Segundo o governo federal, serão R$ 523,7 bilhões em gastos tributários em 2024. O desconto em impostos contidos no Simples Nacional, para incentivar o trabalho de pequenas empresas, representa R$ 125 bilhões desse valor.

Além disso, o governo também dá subsídios principalmente em linhas de crédito para compra da casa própria e para incentivo de determinados setores. Considerando esse subsídios, os benefícios concedidos pelo governo chegaram a R$ 647 bilhões em 2023.

Evolução

O valor que o governo gasta com esses benefícios era de R$ 51 bilhões em 2003, há 20 anos. Corrigido pela inflação, o valor chega a R$ 156 bilhões.

Há 20 anos, o Brasil comprometia o equivalente a 3% do seu Produto Interno Bruto (PIB) com os chamados benefícios fiscais. Em 2023, isso dobrou. São 6% do PIB.

O percentual permaneceu o mesmo de 2022 para 2023, primeiro ano do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em compensação, cresceu de 4,8% para para 6% de 2018 a 2022, durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

As isenções e subsídios somavam R$ 333 bilhões em 2018, com correção monetária. Em 2022, último ano do governo Bolsonaro, elas chegaram a R$ 603 bilhões.

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