ouça este conteúdo
|
readme
|
Por Gabriel Gomes
O artigo 19 da Constituição Federal de 1988 proíbe que a União, os estados e os municípios “estabeleçam ou subvencionem cultos religiosos ou igrejas”, fixando a separação administrativa entre Estado e religião. Baseado nesse e em outros artigos da Lei Magna, o Movimento Brasil Laico luta contra a interferência das religiões na política, denuncia casos de propaganda eleitoral em templos e se articula para criar o “Dia Nacional do Estado Laico”.
A ideia do movimento surgiu em 2018, diante dos casos de propaganda eleitoral em igrejas nas eleições vencidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como um grupo nas redes sociais. O movimento foi oficialmente criado em junho de 2021, em assembleia realizada em Recife, Pernambuco.
“A gente teve a ideia de criar um movimento nas redes sociais para mobilizar pessoas no país inteiro que lutassem pelo Estado laico e, também, mobilizar a sociedade para fiscalizar e denunciar a propaganda eleitoral nos espaços religiosos”, explica o criador e diretor-presidente do movimento, Leandro Patrício.
O grupo atua acionando o Ministério Público em diversos estados contra qualquer tipo de ato público que viole a laicidade do Estado. O movimento também atua, nas redes sociais, publicando casos de propaganda eleitoral em templos e funciona como uma espécie de “observatório” do mandato de parlamentares ligados às bancadas religiosas.
O movimento tem proposto, em parlamentos estaduais e municipais Brasil afora, a criação do “Dia do Estado Laico” em nível local. O objetivo, no entanto, é maior: a aprovação da data comemorativa no Congresso Nacional para todo o país. “A ideia é estimular o debate porque há uma incompreensão muito grande no que se refere ao Estado laico, do que é a laicidade. Isso se dá por conta da própria Constituição que apresenta contradições internas e lacunas”, diz Leandro Patrício.
“Esse avanço de grupos fundamentalistas sobre o Estado conta com a impunidade que há na sociedade dessa prática absurda que é a propaganda eleitoral nos templos. Isso é vedado pela lei das eleições, mas não há fiscalização adequada, não há denúncias ou essas são, muitas vezes, incompletas e acaba não dando em nada”, completa.

Ato realizado pelo grupo em janeiro de 2020, em Recife. (Foto: Arquivo Pessoal)
5 de outubro — ‘Dia do Estado Laico’
A ideia do movimento é que o “Dia do Estado Laico” seja comemorado no dia 5 de outubro. A data marca a promulgação da Constituição de 1988, que assegura, em seu texto, o direito à liberdade religiosa e a separação entre o Estado e as religiões.
Nas articulações com parlamentares de diversas cidades e estados do Brasil, o grupo abre a possibilidade de a data ser chamada de “Dia do Estado Laico e Liberdade Religiosa”, como uma forma de conquistar o apoio de outros parlamentares de diferentes campos políticos.
“Isso pode ser uma flexibilização para que o projeto seja aprovado, mas a gente não abre mão de que seja definido na lei que é dia do Estado laico”, esclarece Leandro Patrício.
No município de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, o movimento conseguiu articular, junto da vereadora Karina Camillo (PT), a realização de uma audiência pública, na última terça-feira (11), para debater “A importância da efetivação do Estado laico para a garantia da liberdade religiosa”. A ideia de audiência foi sugerida por conta do perfil conservador da Câmara da cidade.
Ver essa foto no Instagram
Além de São Leopoldo, o grupo já conta com articulações da proposta de criação da data em Recife, cidade na qual o movimento foi fundado, no estado do Rio de Janeiro, na cidade de Caraguatatuba, no litoral paulista, no estado do Rio Grande do Sul, dentre outros lugares.
Movimento tem forte atuação nas redes sociais
O movimento também possui uma forte atuação nas redes sociais, com a publicação de vídeos e denúncias de casos de propagandas eleitorais em templos religiosos. “A gente não tem nenhum problema em dizer que o foco são as igrejas evangélicas. Não é que a gente persiga, mas sabemos que os evangélicos fundamentalistas são os que mais procuram interferir nas eleições”, declara Leandro Patrício.
Segundo Leandro, as redes sociais do movimento também funcionam como uma espécie de “observatório” dos mandatos de parlamentares ligados às bancadas religiosas em parlamentos federais, estaduais e municipais. O grupo conta com quase 50 mil seguidores no Instagram.

Grupo, criado após as eleições de 2018, atua na denúncia de casos de propaganda eleitoral em templos religiosos. (Foto: Arquivo Pessoal)
“A gente acompanha o que esses parlamentares estão fazendo e divulga como uma forma de denunciar e mobilizar a sociedade civil, através dos meios digitais, para que as pessoas se posicionem criticamente contra isso e defendam a laicidade”, explica Leandro.
A cada ano eleitoral, o grupo também realiza uma grande campanha nas redes sociais de mobilização para que as pessoas fiscalizem e denunciem casos de propaganda eleitoral nos templos.
Como denunciar?
As denúncias de casos de propaganda eleitoral em templos religiosos podem ser feitas por meio do site do Movimento Brasil Laico. As pessoas também podem contactar o grupo por meio do perfil no Instagram. No site, o grupo também oferece um modelo da denúncia que deve ser enviada ao Ministério Público.
O Código Eleitoral vigente (Lei 9.504/97, art. 37) considera a propaganda eleitoral nos templos religiosos como irregular, sendo tipificada como abuso de poder econômico, passível de punição aos envolvidos.
Relacionados
‘Jamais defenderia abusadores, também não sou homofóbica’, diz Baby do Brasil
Pastora e cantora foi criticada por pregar em culto na casa noturna D-Edge que vítimas perdoem seus abusadores
O Estado não deve controlar a religião e vice-versa
No Brasil, há igualdade religiosa e vigora o Estado laico?
Após protestos contra líder, ex-testemunhas de Jeová querem ir à Justiça contra igreja
Grupo está reunindo documentos para ir à Justiça contra a organização que gere a comunidade religiosa no Brasil