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Jessé Souza

Escritor, pesquisador e professor universitário. Autor de mais de 30 livros dentre eles os bestsellers “A elite do Atraso”, “A classe média no espelho”, “A ralé brasileira” e “Como o racismo criou o Brasil”. Doutor em sociologia pela universidade Heidelberg, Alemanha, e pós doutor em filosofia e psicanálise pela New School for Social Research, Nova Iorque, EUA

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As joias do capitão

Esperemos que o nosso Al Capone receba o castigo que mereceu mais do que qualquer outro facínora deste país
13/07/2024 | 09h19

O caso rumoroso envolvendo Bolsonaro e a venda de joias, recebidas quando era presidente, vendidas em leilões nos Estados Unidos não deve ter surpreendido muita gente. Bolsonaro foi construído na cultura da corrupção — que é o que a milícia carioca significa — e toda a sua vida dá mostras disso. Acho, inclusive, que ele acredita que não está fazendo nada de errado e está apenas agindo como todo mundo agiria no lugar dele. Um sujeito tão autorreferido não tem o costume de se pôr no lugar dos outros, nem muito menos assumir a postura do respeito a normas universais. A ética do capitão é a da lealdade pessoal e da gratidão como qualquer mafioso.

A nossa sorte como país é a absoluta incompetência de Bolsonaro e de quem o cerca. O caso das joias é roubo de amador para dizer o mínimo, do mesmo modo que o golpe foi coisa de amador e de quem não tem preparo para coisa alguma. Que bom! O caso mais interessante é o das joias sauditas para a mulher do ex-presidente Michele Bolsonaro. Não só somam, apenas elas, quase seis milhões de reais, de longe o lote mais valioso de todo o imbróglio, como também soam como parte do pagamento da propina presidencial para venda de uma refinaria subfaturada ao príncipe saudita. A parte do Leão foi para onde? Ou alguém acha que vender refinarias pela metade do preço de mercado não é um negócio das arábias?

O mais interessante disso tudo é se for realmente possível colar o epíteto de “ladrão de joias” em Bolsonaro. Esse caso me lembra muito o de outro mafioso, como Bolsonaro, que é Al Capone. Capone tendo matado dezenas de pessoas é condenado finalmente por conta de uma fraude no imposto de renda. Um crime pelo qual recebe a pena máxima de 11 anos. Bolsonaro é um genocida talvez pior que Capone, mas dificilmente vai responder por todos os seus crimes maiores. Que seja então como ladrão de joias. O que importa é que a Justiça o atinja e que seu prestígio fique abalado.

Quanto a este último ponto do prestígio abalado não tenho tanta certeza do sucesso. Eu entrevistei centenas de bolsonaristas para meu livro novo, a ser lançado no ICL em breve, e me espantei com a desfaçatez das desculpas que seu eleitor inventa para perdoar o seu mito. Muitos responderão para relativizar qualquer ação de Bolsonaro: ah qual político brasileiro não é ladrão? Ele de qualquer jeito é o menos ruim porque defende a família e as boas causas do moralismo conservador. Ou ainda que as notícias são fake news inventadas pelos inimigos.

No entanto, para aqueles que dividem o mundo em mocinhos e bandidos, ou entre gente de bem e comunistas, é sem dúvida um grande baque ver seu ídolo por trás das grades. A prisão é tida universalmente como comprovação empírica de comportamento imoral e corrupto. Pode-se tentar montar os juízes do STF como perseguidores, mas se torna cada vez mais difícil se utilizar o mesmo procedimento para a Polícia Federal e o Ministério Público. Instituições que no governo Bolsonaro eram só motivo de elogio.

Esperemos que o nosso Al Capone receba o castigo que mereceu mais do que qualquer outro facínora deste país. Seria um baque sério para o fascismo mambembe tupiniquim. Ao fim e ao cabo são criminosos comuns que tinham como chefe da quadrilha um presidente da república que só faltava furtar celulares dos líderes estrangeiros que o visitavam.

 

 

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