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Valdemar Figueredo (Dema)

Idealizador e coordenador desde 2017 do Observatório da Cena Política Evangélica pelo Instituto Mosaico (www.institutomosaico.com.br). Pós-doutorando em sociologia pela USP. Doutor em ciência política (antigo IUPERJ, atual IESP-UERJ) e em teologia (PUC-RJ). Pastor da Igreja Batista do Leme e da Igreja Batista da Esperança, ambas na cidade do Rio de Janeiro.

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Do jeito que as coisas estão, o diabo vai colocar alguns crentes na Justiça por plágio

Notícias falsas propagadas por influenciadores digitais evangélicos atrapalham ajuda às vítimas de inundação no RS
14/05/2024 | 05h00

Como não quero ser processado por plágio, preciso dizer que a frase do título pertence ao amigo botafoguense Alex Possati (@arpossati). Pastor e professor multitalentoso que articula temas como Direitos Humanos, Teologia, política e ações humanitárias.

“Engravidar pelo ouvido” é uma expressão popular que praticamente caiu em desuso no mundo das redes sociais. Tem mais a ver com o universo dos leitores de livros e artigos impressos.

Dizia-se que alguém “engravidou pelo ouvido” quando tentava impressionar com oratória rebuscada reproduzindo o conteúdo de algo que leu na véspera. Dava ares de erudição, mas era um artifício de se apropriar das ideias alheias sem dar os devidos créditos. Isso podia acontecer também inconscientemente, sem qualquer má-fé.

O ódio se globalizou e os engenheiros do caos, termo utilizado por Giuliano Da Empoli, se sentem empoderados até para procurar roubar a cena de uma tragédia da dimensão das enchentes no Rio Grande do Sul (RS).

Na verdade, estão reeditando o que fizeram durante a pandemia de Covid-19. Negacionistas confessos, fazem de tragédias oportunidade para desacreditar a ciência, o jornalismo, as instituições republicanas, o governo de plantão, a democracia e toda e qualquer pessoa que não reza no catecismo da extrema direita.

Seja qual for o grupo que frequentamos ou o Estado da federação no qual estejamos, sobre a tragédia vivida pelo Rio Grande do Sul, convivemos com um volume enorme de desinformação como se fosse uma torrente incontrolável.

Sem qualquer critério, gente aparentemente séria e honesta reproduz com força e gosto as “notícias” que tiveram acesso na véspera. Não adianta perguntar pelas fontes seguras para quem decidiu acreditar incondicionalmente nos apóstolos do caos.

Entre os domingos 05 e 12 de maio, período em que monitorei evangélicos expoentes da extrema direita brasileira, pouca atenção foi dada para os resgastes e as ondas de solidariedade porque logo se ocuparam das campanhas difamatórias. Importava escalar rapidamente quem levaria a culpa.

Sobrou imediatamente para o inusitado dueto entre Lula e Madonna. Escatologias criativas a parte, maldizentes moralistas tentaram preservar o ódio aceso mesmo no meio de uma tempestade assustadora.

É preciso prestar atenção nas mudanças climáticas e nos alertas da natureza. Contudo, de maneira inequívoca e imediata era preciso socorrer as pessoas e os animais.

O Rio Grande do Sul ainda contava os mortos, procurava os desaparecidos e fazia mutirões para limpar as casas submersas na lama, e os agentes do caos das suas torres digitais só conseguiam se ocupar com a procura dos culpados.

O icônico Coringa, em “Batman: o cavaleiro das trevas”, articula uma frase que descreve bem esse nosso tempo, marcado pelas sabotagens das ditas pessoas do bem: “Introduza um pouco de anarquia. Perturbe a ordem vigente, e tudo se torna o caos. Eu sou um agente do caos.”

Mas o perturbador é que no nosso caso, o caos já estava instaurado pela tempestade sem precedentes recentes no Rio Grande do Sul. Será que o Coringa seria diabólico a ponto de agir no caos para fomentar mais sofrimento? O Coringa da ficção não sei. Mas quanto a muitos crentes bolsonaristas, não tenho dúvidas.

Os haters postam comentários de ódio, enquanto trolls pretendem desestabilizar as conversas racionais na internet zoando para desqualificar. Seria desumano caso alguém assumisse intencionalmente tais papéis durante a trágica enchente.

E quando o alguém tem forma concreta, habita perto, é bem familiar e cita a Bíblia com voz de autoridade? Somos capazes de ficar mais desnorteados com a maldade da gente do bem do que com o volume das águas.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) em entrevista a Míriam Leitão no jornal O Globo, em 10/05/2024, se pronunciou nos seguintes termos: “O que acontece nessa tragédia dramática que nós vivemos no Rio Grande do Sul é mais uma evidência da necessidade de ter regras para combater a desinformação”.

Até a finalização deste artigo, os números lamentáveis da tragédia no RS que não conseguimos mensurar em termos de perdas humanas: 147 mortos, 127 desaparecidos, 806 feridos, 538.245 desalojados, 77.405 pessoas em abrigos, 2.124.203 pessoas afetadas no estado. Do total de 497 municípios do estado, 450 foram afetados pela tragédia (Fonte: Boletim da Defesa Civil gaúcha divulgado na manhã do dia 13/-5/2024).

Em João 8.24 Jesus diz que “o diabo é o pai da mentira.”

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