Durante a cúpula do Mercosul realizada na quinta-feira (3), em Buenos Aires, o presidente Lula (PT) fez uma firme defesa da integração comercial entre os países do bloco e de uma atuação conjunta frente aos desafios climáticos, tecnológicos e de segurança. Em um discurso que contrastou diretamente com as críticas do presidente argentino, Javier Milei, Lula afirmou que o Mercosul “protege” os países-membros e fortalece sua posição global.
“Estar no Mercosul nos protege. Nossa tarifa externa comum nos blinda de guerras comerciais alheias. Nossa robustez institucional nos credencia perante o mundo como parceiros confiáveis”, disse Lula.
Enquanto isso, Milei — que passou a presidência rotativa do bloco ao Brasil — voltou a criticar a estrutura atual do Mercosul, chamando-a de “cortina de ferro” que impõe barreiras à liberdade comercial e prejudica as populações ao encarecer bens e serviços.
Esta foi a primeira visita de Lula à Argentina desde a posse de Javier Milei, marcada por uma relação diplomática cautelosa. Apesar de críticas públicas anteriores, os dois presidentes mantiveram um tom institucional durante o evento. A transição da presidência do Mercosul foi feita de maneira protocolar, com troca de cumprimentos formais.
As divergências, no entanto, são evidentes. Enquanto Lula aposta em uma integração regional fortalecida, Milei continua a defender a flexibilização das regras do bloco e mais liberdade para que os países-membros firmem acordos comerciais bilaterais por conta própria.
“Embarcaremos no caminho da liberdade, e o faremos juntos ou sozinhos, porque a Argentina não pode esperar”, disse Milei.
Lula estabelece acordos comerciais como prioridade estratégica
À frente da presidência do Mercosul até dezembro, Lula afirmou que uma de suas metas é concluir as tratativas do acordo de livre comércio com a União Europeia, cuja negociação se arrasta há mais de 20 anos. Ele também destacou que o Brasil avançará nas conversas com o Canadá, Emirados Árabes Unidos, Panamá, República Dominicana e buscará atualizar acordos com Colômbia e Equador.
“Estamos confiantes de que conseguiremos assinar o acordo com a União Europeia ainda este ano”, disse Lula.
O presidente brasileiro destacou também o foco do bloco em diversificar relações comerciais e reforçou a importância de uma aproximação com países da Ásia, como China, Japão, Coreia do Sul, Índia, Vietnã e Indonésia, apontando a região como o novo centro dinâmico da economia mundial.
Clima e transição energética
Lula colocou o combate às mudanças climáticas e a promoção da transição energética como pilares de sua presidência temporária. O presidente argumentou que a América do Sul tem vantagens naturais e estruturais que a posicionam como protagonista da agenda ambiental global.
“Já temos matrizes energéticas mais limpas que outras regiões e contamos com algumas das maiores reservas de minerais críticos do mundo”, afirmou.
Ele também defendeu o lançamento do programa Mercosul Verde, com foco em agricultura sustentável e descarbonização da economia, e destacou que o Brasil pretende reduzir suas emissões de gases de efeito estufa entre 59% e 67% até 2035.
A realização da COP30, em 2025, em Belém (PA), foi mencionada como uma oportunidade para mostrar ao mundo os avanços sul-americanos na preservação ambiental e combate ao desmatamento.
Combate ao crime organizado
Outro ponto central do discurso de Lula foi a proposta de atuação coordenada dos países do Mercosul contra o crime organizado transnacional. Ele apontou que facções criminosas operam além das fronteiras e que apenas uma resposta integrada será capaz de enfrentar essas “multinacionais do crime”.
“Precisamos investir em inteligência, conter os fluxos de armas e asfixiar os recursos que financiam a indústria do crime”, disse Lula.
Segundo o presidente, o Brasil vai mobilizar o “Mercosul ampliado” para aprimorar a colaboração na área de segurança pública.
Infraestrutura, moedas locais e soberania digital
Lula também propôs modernizar o sistema de pagamentos do Mercosul, com maior uso de moedas locais em transações digitais. Ele defendeu a conclusão da chamada Rota Bioceânica, que ligará o Brasil ao Pacífico via Paraguai, Argentina e Chile, reduzindo em até duas semanas o tempo de transporte de cargas para a Ásia.
O presidente ainda destacou a importância de estabelecer centros de dados na América do Sul como forma de garantir soberania digital e autonomia tecnológica para os países da região. “Precisamos investir em pesquisa e desenvolvimento para sermos protagonistas na saúde, na inovação e na transformação digital”, disse.
Mercosul-EFTA e a visão pragmática do Brasil
Além da União Europeia, o Brasil também quer concluir a implementação do acordo com a EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio), formada por Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça. Segundo o Itamaraty, as negociações estão finalizadas e o texto do acordo está em revisão, com previsão de divulgação em agosto.
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