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Valdemar Figueredo (Dema)

Idealizador e coordenador desde 2017 do Observatório da Cena Política Evangélica pelo Instituto Mosaico (www.institutomosaico.com.br). Pós-doutorando em sociologia pela USP. Doutor em ciência política (antigo IUPERJ, atual IESP-UERJ) e em teologia (PUC-RJ). Pastor da Igreja Batista do Leme e da Igreja Batista da Esperança, ambas na cidade do Rio de Janeiro.

Em defesa da (minha) família tradicional

Laços de família são determinantes para a formação das bancadas evangélicas nas casas legislativas
20/02/2024 | 05h15

– No dia 12 de novembro de 2016, o plenário da Câmara cassou o mandato do então deputado Eduardo Cunha (à época no PMDB–RJ). O ex-presidente da Casa que protagonizou o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff se autointitula evangélico, defensor da vida e da família. No pleito de 2022 conseguiu emplacar para o primeiro mandato de deputada federal a sua filha Dani Cunha (União–RJ, 75.810 votos).

– O líder máximo da Igreja Universal do Reino de Deus, bispo Edir Macedo, controla estruturas eclesiástica, midiática, empresarial e política. A despeito do poder plural que dispõe a partir da estrutura partidária, o Bispo Macedo não ignora os laços familiares. Nas eleições de 2022 conseguiu novamente eleger para a Câmara dos Deputados o sobrinho Marcelo Crivella (Republicanos–RJ, 110.450 votos).

– Slogan que o sorridente televangelista R. R. Soares vocaliza no período eleitoral sem qualquer constrangimento: “Mesmo sangue, mesma fé e mesmo amor”. Em 2022, foi muito além do marketing político e legitimou religiosamente as eleições dos filhos: para o terceiro mandato na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), o deputado Filipe Soares (União–RJ, 37.473 votos); para o segundo mandato na Câmara Federal, o deputado Marcos Soares (União–RJ, 43.533 votos); para o segundo mandato na Câmara Federal o deputado David Soares (União–SP, 93.831 votos); o quarto filho, Daniel Soares (União–SP, 81.753 votos), foi reeleito deputado estadual por São Paulo; e, finalmente, o quinto filho, André Soares (DEM-SP), entre 2007 e 2019 cumpriu três mandatos como deputado na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). É raro encontrar um pai de cinco “meninos” e mais raro ainda todos terem em comum a vocação para defender os valores e negócios da família.

– O pastor Silas Malafaia é tradicionalmente o principal cabo eleitoral do seu irmão Samuel Malafaia (PL–RJ, 72.056 votos). Reconduzido nas eleições de 2022 para cumprir o quinto mandato como deputado na Alerj, Samuel Malafaia demarca em letras garrafais o seu perfil político: em defesa da família e dos valores cristãos.

– A Rede Boas Novas de comunicação é controlada pelo pastor Samuel Câmara, líder de um dos principais segmento pentecostais do país, a Igreja Assembleia de Deus em Belém do Pará. Para os pleitos eleitorais ele indica reiteradamente o seu irmão e sua cunhada, Silas Câmara (Republicanos–AM, 125.068 votos) e Antônia Lúcia (Republicano–AC, 16.280 votos). Enquanto a deputada Antônia Lúcia cumpre o segundo mandato, o marido, deputado Silas Câmara, que em 2023 presidiu a Frente Parlamentar Evangélica, teve o seu sétimo mandato cassado em 31 de janeiro de 2024 pelo TRE–AM, após julgado e condenado por gastos ilícitos com recursos financeiros na campanha eleitoral de 2022.

– O pastor José Wellington Bezerra da Costa, presidente de honra da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) e pastor presidente da Igreja Evangélica Assembleia de Deus Ministério do Belém, Campinas–SP, tem sido, por décadas, um dos líderes evangélicos mais influentes. Nas eleições de 2022 renovou a unção sobre o seu filho Paulo Freire (PL–SP, 161.675 votos), voto de confiança que foi determinante para elegê-lo ao quarto mandato como deputado na Câmara Federal.

É provável que os leitores desta coluna lembrem de outros casos não mencionados aqui. Os citados servem como amostragem do fenômeno para o qual chamo atenção: laços de família são determinantes para a formação das bancadas evangélicas nas casas legislativas. Em alguns casos, os interesses privados de algumas famílias precedem os interesses das igrejas e não dão a mínima para os interesses públicos.

E ainda têm a coragem de chamar isso de defesa da família tradicional.

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