Por Bernardo Cotrim*
Nos últimos dias, assistimos a uma verdadeira blitzkrieg comunicacional tendo o governo Lula como alvo.
Primeiro, a capa da Veja ilustrando uma corrida pelo espólio do Bolsonarismo para as eleições de 2026, com o governador de SP, Tarcísio de Freitas, à frente de seus “concorrentes” Zema, Caiado e Michelle Bolsonaro.
Depois, o “jantar de amigos” patrocinado por Luciano Hulk, com o presidente do BaCen Roberto Campos Neto e, novamente, Tarcísio como convidados de honra e estrelas da noite.
O caldo engrossou com a sequência de editoriais de Estadão, Folha e O Globo cobrindo o mesmo Tarcísio de pornográficos elogios por apresentar um “plano de diretrizes” que “aponta um exemplo para o país”, em contraste com a suposta “falta de rumo” de um governo federal “perdulário”.
Não interessa que o “documento” de Tarcísio seja profundo como um pires, com ares de coletânea de bordões neoliberais cuspida pelo chatGPT; tampouco importa que nada ali tenha efetivamente saído do discurso.
O que parece importar, para a “grande imprensa brasileira”, é que Tarcísio afirme publicamente a cantilena que faz a cabeça dos barões da mídia e seus porta-vozes, carentes de representação política desde que o golpe de 2016 abriu alas para a extrema direita atropelar a direita tradicional e transformar o PSDB em um zumbi sem rumo nem votos.
Note-se, na origem deste movimento, um fato: a tragédia climática ocorrida no RS revelou que, por trás do ar “direita moderna” do governador gaúcho Eduardo Leite, grassava uma incompetência tão absoluta que nem a extrema boa vontade do noticiário foi capaz de esconder.
Com isso, escancarou-se a avenida para o flerte explícito com o governador paulista, de olho nas eleições de 2026.
Não por acaso, a gritante “milicianização” da PM paulista, posta em marcha por Tarcísio e seu secretário de segurança Guilherme Derrite, um ex-policial da ROTA afastado por — pasmem! — matar demais, é solenemente ignorada pelo noticiário hegemônico, assim como as escolas cívico-militares, sinistra perversão do sistema educacional aprovada com truculência ímpar.
Os escândalos de corrupção, com empresas de propriedade de secretários do governo ganhando sucessivas licitações e recebendo milhões de reais, também desapareceram da cobertura.
Sobraram apenas as loas à retórica fiscalista e ao desmanche da coisa pública, com a promessa de 44 leilões até o fim do mandato.
A adesão midiática ao mais polido dos fascistas revela, para quem ainda nutria alguma expectativa em uma direita “civilizada”, que o centro do conflito entre Bolsonaro e os liberais nunca foi o programa, e sim, a falta de modos.
Tivesse o ex-presidente controlado os flatos em público, evitado os palavrões e quiçá comprado algumas vacinas, provavelmente teria contado com a mesma unidade burguesa a fingir cegueira diante de suas relações promíscuas com o crime organizado e apoiar sua reeleição contra o intragável retorno do “lulopetismo”.
Tarcísio parece mais cuidadoso com seu futuro político e já aprendeu que não é difícil conciliar os acenos econômicos aos viúvos do tucanato com o autoritarismo, a violência e o fetiche militarista bem ao gosto da horda bolsonarista sedenta de sangue.
Basta usar corretamente os talheres. Afinal de contas, quem gosta de democracia e direitos sociais é a esquerda; o neoliberalismo gosta mesmo é de dinheiro.
PS: Enquanto este artigo era escrito, o push do navegador me empurrava uma sequência de manchetes nas quais o nome de Lula aparece em destaque, sempre em associação a algo negativo.
Em sessão do Congresso para analisar os vetos presidenciais, o sinistro conluio entre o Centrão, os neoliberais e a extrema direita reuniu-se novamente para impor retrocessos civilizatórios.
Para a imprensa, entretanto, a marcha reacionária trata-se apenas de “derrota do governo federal”. Definitivamente, 2026 já começou.
*Bernardo Cotrim é jornalista e gerente de mídias do ICL
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