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Por Dandara Tonantzin*

Muito se debate sobre a necessidade de “renovação” na esquerda brasileira — renovação que não se resuma ao âmbito geracional, mas que englobe também o campo das ideias e de novas formas de se fazer política.

Vivemos hoje uma fase de profundas mudanças na economia global e nas dinâmicas de acumulação de capital, marcada pelo exponencial avanço tecnológico que possibilita o surgimento de novas formas de exploração do trabalho, ancoradas em sua precarização.

O desarranjo econômico pós-pandemia alimentou a falta de esperança da classe trabalhadora em modificar seu escasso quinhão na distribuição da renda nacional, concentrada em níveis inéditos nas mãos de ainda menos pessoas; as novas gerações angustiam-se pela possibilidade de não conseguir obter um padrão de vida equivalente ao de seus pais e avós, senão pior.

Paira sobre elas a perspectiva de um futuro próximo, no qual sua formação profissional, suas habilidades e capacidades produtivas poderão ser ameaçadas pela Inteligência Artificial. Soma-se a isso ainda o temor pela incerteza quanto ao futuro do nosso planeta diante de eventos climáticos extremos. A “crise do futuro” provoca uma crise de esperança.

Ante a percepção de que o Estado não consegue dar respostas ou auxílio nessas questões tão cruciais, e bombardeadas constantemente por agentes de uma ideologia neoliberal niilista tão onipresente quanto dissimulada, as pessoas inclinam-se cada vez mais ao individualismo e ao imediatismo, rejeitando valores coletivos como a empatia e a solidariedade ao próximo, e não raro abraçando o extremismo.

As eleições municipais de 2024, marcadas pelo uso da máquina pública e dos recursos oriundos de emendas parlamentares que garantiram em patamares históricos a reeleição dos atuais mandatários, evidenciaram também a consolidação do ideário político conservador. Afinal, manter o que está (ou garantir o que se tem) se torna mais conveniente do que apostar em mudanças para um futuro incerto e pouco promissor.

Ao mesmo tempo, os altos índices de abstenção denotam rejeição e apatia em grande parte do eleitorado com a política. Como esse contexto de mudanças sociais nos provoca a pensar novos arranjos da esquerda brasileira para o futuro?

Uma prioridade deve ser a de olhar com mais atenção para o interior do Brasil. O Censo de 2022 mostrou que 41% da população brasileira vive nas cidades interioranas e que o maior crescimento populacional do Brasil, entre 2010 e 2020, se deu em regiões fora dos grandes centros urbanos das capitais. A dinâmica do crescimento econômico brasileiro mais descentralizado revela o protagonismo econômico dos municípios do interior, que emergem como importantes polos econômicos.

O crescente desenvolvimento e complexidade dessa parte do país implica que seu modo de vida, suas prioridades e interesses devem estar representados nos debates nacionais, garantindo, por exemplo, medidas redistributivas para diminuir as desigualdades regionais. Por exemplo, a regulamentação da reforma tributária, cujos orçamentos municipais devam ser preservados, porque são eles que custeiam serviços públicos locais que não podem ser ainda mais precarizados.

Tal qual os grandes centros, no interior também estão presentes intensas desigualdades sociais e de acesso aos meios de vida. Portanto, a renovação da esquerda brasileira depende de uma forte reconexão com o interior do Brasil.

As esquerdas devem saber formular e propor um novo ciclo de políticas públicas locais inovadoras. Mais especificamente, devem se sentir mais desafiadas a responder aos temas particulares das pequenas e médias cidades — a grande maioria delas dominadas pelo sentimento conservador.

A condição de possibilidade do progressista é a de existir esperança no futuro. Se quiser esperançar o país, as esquerdas precisarão priorizar a capacidade de esperançar também a força do interior do Brasil. Estando presente e mais próxima das dinâmicas de produção de importantes identidades nacionais.

Ali, onde ao mesmo tempo em que está cravado o Brasil profundo, também está o novo Brasil emergente.

 

* Dandara Tonantzin é professora, mestre em educação pela UFMG e deputada federal pelo PT/MG.

 

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