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Escolas cívico-militares de SC gastam mais e pioram indicadores, mostra estudo

Militarização das escolas estaduais em Santa Catarina promoveu uma piora de 8% no resultado do Ideb para o nível de Ensino Médio
19/10/2024 | 07h00

Por Amanda Miranda — Newsletter Passando a Limpo

As escolas cívico-militares de Santa Catarina, mantidas pelo governo bolsonarista estadual mesmo após decretado o fim do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim), consomem mais recursos que as convencionais e apresentam queda no indicador de avaliação de ensino, o Ideb. Os dados foram divulgados em um estudo do Sindicato dos Trabalhadores em Educação, o Sinte, e demonstram que faltam justificativas para a manutenção do projeto.

Segundo o estudo, a militarização das escolas estaduais em Santa Catarina promoveu uma piora de 8% no resultado do Ideb para o nível de Ensino Médio em comparação com escolas de características semelhantes, mas que não foram militarizadas. O economista Mauricio Mulinari, um dos autores da pesquisa, explica que a comparação foi feita tendo como base o tamanho das escolas e também as características das regiões, para evitar distorções.

“O impacto estimado, ao contrário da propaganda do governo, foi negativo, de -7,6%. Isso significa que uma escola que tinha Ideb de, por exemplo, 5 pontos no Ensino Médio antes da militarização, teve sua nota reduzida para 4,62 pontos em 2023”, sintetiza a pesquisa.

O sindicato alerta para a falta de eficácia no modelo. “Estamos falando há muitos anos sobre a ineficiência do modelo. A educação deve receber investimentos em áreas fundamentais, nos profissionais de educação, na valorização, no quadro completo de profissionais, que sejam concursados, que tenham um vínculo com a escola, que tenham compromisso com a unidade escolar e também que sejam preparados”, pontua o coordenador do Sinte, Evandro Accadrolli.

A presidente da Comissão de Cultura e Educação da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, Luciane Carminatti (PT), também questiona a validade do programa. Para ela, não há garantia que essas escolas tenham melhor qualidade de ensino. “O que temos é mais investimentos que as demais escolas públicas”, explica a parlamentar.

A diferença nos investimentos foi confirmada na análise do Sinte, que expôs o contraste entre as dez escolas cívico-militares tratadas como vitrine pelo governo e as outras unidades da rede. As escolas cívico-militares tiveram quase o dobro de investimento em infraestrutura por estudante do que as demais, acumulando R$ 11,7 milhões em obras desde 2021.

Segundo o decreto estadual que instituiu o Programa Estadual das Escolas Cívico-Militares, um dos objetivos do projeto é justamente “contribuir para a elevação dos índices de desenvolvimento da educação básica”. O texto também revela que as escolas civis-militares devem ser vitrines para as demais, já que um dos seus princípios seria induzir “boas práticas como meio para a melhoria do ensino público”.

Deputada Luciane Carminatti (PT)

Disparidades entre escolas

As escolas cívico-militares recebem melhorias na estrutura, contam com laboratórios e espaços de atividades físicas, além de maior equipe de apoio pedagógico fora da sala de aula com ao menos nove profissionais. Somente uma das escolas, a Ildefonso Linhares, em Florianópolis, recebeu R$ 6.743.990,10 desde que foi militarizada, em 2022, quando o Pecim ainda estava em vigor.

Para a deputada Carminatti, o governo escolhe, no modelo cívico-militar, investir muito em poucas escolas enquanto há centenas de outras precisando de estrutura física e de recursos humanos, como psicólogos, assistentes sociais, projetos de arte, cultura e esportes.

“Enquanto isso, temos escolas que aguardam há anos por reformas e estudantes tendo aulas em salas lotadas e em espaços improvisados como salões de igrejas e galpões. Não seria melhor equilibrar esse investimento? No lugar de concentrar muito para poucos alunos, garantir que todos tenham uma condição mínima de estudo?”, questiona a deputada.

Ela chegou a fazer um pedido de informação à Secretaria de Estado da Educação no início de 2024 para saber o total de escolas que precisam de reformas, quantas têm projetos concluídos e os prazos para as obras. Até este mês de outubro, não foi respondido.

Folha de pagamento também cresceu

O investimento com profissionais da educação em relação ao número de matrículas, também aumentou mais nos colégios militarizados. No projeto herdado de Bolsonaro e encerrado pelo governo Lula justamente pela falta de indicadores e dados específicos sobre a eficácia do modelo, profissionais militares atuam dentro das escolas, na gestão de processos educacionais, pedagógicos e administrativos. “Acreditamos que essa educação deve ser feita pelos trabalhadores formados para essa função de educar”, salienta Accadrolli.

Entre os custos assumidos pelo governo Jorginho Mello após o fim do projeto de Bolsonaro, estão R$ 9 milhões ao ano para pagar militares da reserva que atuam no projeto. Estes recursos, segundo o Sinte, deveriam ser investidos em equipe técnica de educação.

“Todas as intervenções de militares no fazer da sociedade civil são autoritárias. Muitas vezes atentam contra a liberdade de cátedra e impedem assuntos críticos, tirando a diversidade da ciência e do conhecimento. É uma postura conservadora, que conserva uma sociedade desigual”, pontua o coordenador.

O volume de servidores da Secretaria da Educação à disposição das unidades também beneficia as escolas cívico-militares. O grupo de 10 escolas que foram militarizadas teve um crescimento nominal de 119% na sua folha de pagamentos nos últimos quatro anos, enquanto nas outras o índice foi de 86%, concentrado em contratos de profissionais temporários, os chamados ACTs.

Militares em todas as escolas

Outro ponto trazido à tona pelo estudo divulgado pelo Sinte foi o custo do programa Rede de Segurança Escolar, que levou militares aposentados para cerca de duas mil escolas da rede com a justificativa de aumentarem o policiamento. Isso fez com que o orçamento da Secretaria da Educação comprometido com o pagamento de pessoal militar em 2024 tenha chegado a R$ 20,6 milhões. Em 2023, essa despesa era de R$ 8,5 milhões.

O Sinte vê o programa com preocupação, pois seria “um passo decisivo em direção ao modelo de militarização das escolas, em detrimento de soluções alternativas alicerçadas na conscientização, no acompanhamento psicológico e na integração humanizada da comunidade ao ambiente escolar”.

Expansão do projeto

Com dez escolas operando conforme esse modelo, o governo de Santa Catarina ampliou o projeto em 2024, na Escola Estadual de São José, em Herval d’Oeste. A unidade tem 480 alunos, das turmas do 6º ano do Ensino Fundamental até à 3ª série do Ensino Médio. Sua estrutura é composta por 22 salas de aula, quatro laboratórios, auditório e ginásio de esportes.

O governo estadual se recusou a responder se há projeto para novas unidades em curso, assim como também não comentou a diferença nos indicadores das escolas civil-militares em comparação com as demais da rede. Apesar de já ter enviado o orçamento de 2025 à Assembleia, o governo também não informou qual o volume previsto para o investimento nesse tipo de escola no próximo ano.

 

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